Educar com Amor
Naquela tarde, duas jovens alunas chegaram ao colégio, chorando. Tomaram seus lugares, a fim de iniciarem as atividades. Durante todo o tempo, permaneceram alheias ao assunto que estava sendo ministrado. Por algumas vezes, chamei-lhes a atenção, mas continuaram viajando, sem mínima conexão ao conteúdo que eu havia preparado carinhosamente, com o intuito de despertar interesse e obter resultado excelente.
Cheguei a me culpar pelo insucesso. Como podia, depois de alguns anos no exercício do magistério, sentir-me incapaz de motivar uma aula que trouxesse de volta um pensamento distante? As duas garotas continuavam tristes, apáticas e, de vez em quando, rolavam lágrimas pelos seus rostos. A impressão que passavam, era de que algo muito forte caíra sobre seus corações, esmagando sentimentos que filtravam, com dificuldade, as gotas preciosas. O que teria acontecido, para tirar o brilho daqueles semblantes plenos de viço e beleza? Aproximei-me, então, e falei-lhes ao ouvido: _ Se quiserem conversar, estarei na minha sala à disposição de vocês. Um leve sorriso aflorou em seus lábios, iluminando, um pouco, aqueles corações magoados. Para melhor efeito, coloquei no quadro-verde um pensamento, cuja mensagem tem o poder de elevar o psiquismo de quem se encontra deprimido: “Os caminhos dos homens são rudes demais para sozinhos podermos enfrentá-los. E, no entanto, todos juntos é que havemos de salvar o Mundo.” ( Michel Quoist ).
Nunca pensei que esse pensamento despertasse tanto o interesse dos alunos, a ponto de se transformar em debate, envolvendo pouco a pouco, as garotinhas infelizes que, de certo modo, já estavam preocupando o grupo. Formaram equipes, elaboraram questionários e, para minha surpresa, conseguiram devolver, em parte, a alegria aos corações das colegas. Embora não soubesse o que acontecera com as duas irmãs, era importante para essa turma, amiga e coesa, ajudá-las naquele momento. Durante o trabalho, observei o empenho dos participantes em dinamizar, cada vez mais, de forma bastante agradável, a tarefa que lhes fora confiada. Como um milagre, havia mudado o clima, literalmente. O ambiente tornara-se descontraído e alegre. O sol, amarelo e radiante, entrava pelas janelas, enriquecendo a energia daquela juventude, que sendo agraciada pelos benefícios da educação, adquiria credenciais para elevar o mundo.
No final do debate, cada equipe apresentou conclusões, através de um representante. De repente, fez-se silêncio na classe. As duas irmãs Márcia e Teresa levantaram-se e pediram a palavra. Teresa dirigiu-se a mim, falando emocionada:
_ Professora, quero pedir desculpas pelo nosso comportamento hoje, como também agradecer aos colegas que procuraram fazer a gente feliz. Márcia e eu estamos contentes por ter colegas tão legais!
Diante dessa demonstração sincera de gratidão, todos ficaram de pé e aplaudiram do jeito que a juventude moderna sabe fazer, com palmas, gritos, apitos, etc. como se estivessem em “show” de auditório:
_ Legal! Legal!... Alegria! Alegria!... Não chora! Não chora!....Heiiiiiiiiii!
Terminada a aula, os alunos se retiraram. Márcia e Teresa permaneceram em seus lugares, esperando-me. Percebi que queriam falar alguma coisa e fui ter com elas:
_ Olá!... Estão mais tranqüilas? Foi muito bonita e emocionante a solidariedade da turma, no sentido de ver vocês, assim, mais calmas...
_ Professora, nós lhe devemos uma explicação. Seremos injustas e ingratas, se não contarmos porque causamos toda essa desordem na hora da aula. _ Falou Márcia, bem decidida.
_ Pois não. Podem ficar à vontade, _ respondi.
As duas irmãs se puseram de pé diante de mim.
_ Professora, olhe e veja se descobre algo errado em nós duas. _ Falou Teresa.
Observei-as dos pés à cabeça: Teresa era morena-clara, cabelos castanhos e ondulados, olhos negros, estatura mediana, dezesseis anos; usava o uniforme da escola. Márcia era branca, cabelos castanhos e lisos, olhos negros, estatura mediana, quinze anos. Também uniformizada. Para serem irmãs, fisicamente eram bem diferentes. Revistando-as mais uma vez, detive-me aos poucos adereços que usavam. Descobri o que havia de errado nas duas garotas e que, provavelmente, seria a causa de sua angústia. Um pouco constrangida, indaguei:
_Por que cada uma usa um sapato e um chinelo? (Isso foi o suficiente para que lágrimas descessem de seus olhos.) Se não quiserem contar, não é preciso. Já entendi. Enxuguem estas lágrimas. Ficam feias, chorando. Vou falar com a direção, sobre vocês.
No dia seguinte, quando o sol amarelo e radiante entrou pelas janelas, pude ver a felicidade brilhando em seus olhos.
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Maria de Jesus. Fortaleza, 16/06/2012