TRÊS PÃES
- Me dê trêi pão. Disse ela recolhida em si. A voz abafada, envergonhada, cortada por suas dores e frustrações de ser. Ser o quê? O que é.
- Surtido. Falou como quem mendiga, porém, com três moedas na mão. Cabeça baixa, olhos curiosos, assustados; tinha medo dos que a rodeavam; daqueles olhares flechantes que pareciam transpassar a sua alma.
- só tem francês. Respondeu asperamente o padeiro, que parecia incomodado com a compra da velha senhora, maltrapilha; que não pedia, pagava os custos como qualquer outro que ali estava.
- Não tem doce, moço? Quase murmurou apertando sua blusa encardida de uso e manchada de tanto se lavar.
- Não! Responderam-lhe novamente de forma mais brusca que da primeira vez, mas agora não havia sido o padeiro e sim sua esposa, religiosa fervorosa. Estava irritada com a pobre mulher que lhe fazia o favor de ser freguesa.
Levantou o dedo e ousou: - E a broa, quanto é? Silêncio. Fingiram não ouvi-la. Sentindo sua existência anulada, percorre com os olhos toda a pequena padaria, fitando os vultos ao seu redor, curiosa, novamente com medo. Aqueles olhares gelados, uns de repulsa e outros de pena. Por que não falavam com ela, ou mesmo, respondiam sua pergunta? Não entendia! E a mulher que todos os dias clama a Deus e lê a bíblia? Aquela mesma que todos os dias sai de casa e vai à igreja incansavelmente, infalivelmente, orar... Só orar!
O saco de pão lhe é quase jogado e uma mão se estende requerendo seu pequeno tesouro: as três moedas.
Não escuta um obrigado e diz: - boa noite! Sai meio que se arrastando pelo canto, como um inseto, procurando não ser vista; fugindo dos olhares que pareciam grandes pés ou chinelos atentando esmagar-lhe.
Finalmente saiu de lá (suspira), estava na rua, livre, a salvo, voltando para casa; seu doce refúgio, seu lar. O caminhar torpe segue a estrada reta e some na penumbra; e lá se esquece.
(Leandro Souza)