Eu Não Preciso de Fonoaudiólogo!

Homem que é homem tenta das mais variadas formas provar que é homem. Não insista dizendo a ele que é irrelevante provar isso. Faz parte da conduta de honra de qualquer espécime do gênero. A necessidade de atestar seus dotes com atitudes estranhas e sem nexo nunca será reprimida pela opinião alheia.

Desde a infância, quando o nome da mãe é defendido sem temores pelo menino ofendido em uma partida de futebol; passando pela adolescência quando o que importa é a quantidade de fêmeas conquistadas na madrugada pelo excesso de masculinidade; atingindo a vida adulta com a comparação do poder aquisitivo; e culminando na terceira idade com a fuga de hospitais e médicos.

Todos os homens buscam provar sua honradez. Mas, todos também compartilham de anseios e temores. A busca incansável pela expressão de sua machesa é uma tática para despistar o que atormenta sua complexa estima. Entre tudo que pode o abalar está o pânico que um médico pode proporcionar.

Não qualquer médico. Aquele. Aquele mesmo ao qual prefiro nem escrever o nome de tão assustador que é. Aquele que põe em risco a fama e o respeito adquirido em tantos anos de maestria varonil. Aquele que anseia nossos quarenta anos para adentrar nosso íntimo. Este mesmo. Espero, sinceramente, que meu apego religioso livre-me de chegar a esta idade ou que os avanços tecnológicos poupem-me de tal procedimento.

Ele não é o único. Qualquer um que possua jaleco branco e dê palpites a respeito de nossa saúde é uma ameaça severa. Pense comigo: um homem, graduado em um curso dificílimo ao qual minha mente não tem capacidade para assimilar tais informações, traçará caminhos e trajetos ao qual terei que guiar meus passos e, ainda por cima, tem uma remuneração superior a minha. Humilhante. É ver a personificação da idealização de sua sogra em sua frente. Nenhum homem suporta isso.

Pior ainda quando é mulher. Já não bastasse você estar se expondo, colocando sua imagem em risco por um parecer negativo e deixando de estar no controle do que o cerca; uma linda mulher- médicas geralmente são belíssimas- o observará definhando e tentará ajudá-lo. Que erro ofensivo e grosseiro. Nós somos homens. Nós é que tomamos conta delas e não o contrário.

Eu detesto, definitivamente, ir ao médico.

Recentemente uma amiga me propôs auxílio para que eu procurasse um fonoaudiólogo para melhorar minha oratória. Ela dizia que, em alguns momentos, era difícil entender o que eu dizia. A tese foi: como eu trabalho com comunicação é preferencial que ajuste minha dicção para uma melhor compreensão das minhas ideias.

Não concordei.

É verdade que sempre tive muita dificuldade em passar minha opinião no primeiro momento. As pessoas sempre pedem para que eu repita o que falei. Irrita, admito. Você desenvolve todo um raciocínio, uma filosofia complexa é apregoada para depois ouvir: - Desculpa, não entendi. Pode repetir. – Frustra receber este pedido. A sensação é que não prestam atenção em você, que sua opinião é irrelevante.

Depois de tantos anos já me acostumei. Quando participo de qualquer amigo secreto que a vida proporciona a descrição que mais aparece é esta: - Olha, meu amigo secreto é um rapaz muito legal, o único problema dele é que eu nunca entendo o que ele fala... – Nem me incomodo mais. Isto não tem mais importância.

Encontrei uma forma de comunicação que se adéqua melhor ao meu perfil. Uma forma de transmitir minhas idéias de uma maneira mais clara, mais charmosa e muito mais artística. Uma forma que inspira e impulsiona-me a novos pensamentos e conclusões. Uma forma que recicla e renova-me constantemente.

A literatura.

Honesta e - bem a minha cara – paradoxal, o que escrevo traduz tudo que sinto e penso. Uma forma de datilografar o que se passa dentro de minha mente e coração. Não preciso me importar com o que vão pensar se vão gostar ou não, se vão me aplaudir ou vaiar. Não importa. Ninguém irá me impedir de ser simplesmente eu nestas palavras. As pessoas que realmente querem minha opinião são as mesmas que acompanharam este texto até este ponto.

Eu sou um escritor e não um orador. Eu sou um poeta e não um vereador.

Isto tudo é a minha reação. A tentativa de provar minha masculinidade. Eu não preciso de fonoaudiólogo. Eu sou homem. Eu sou escritor.

Eduardo Dorneles
Enviado por Eduardo Dorneles em 14/06/2012
Reeditado em 14/06/2012
Código do texto: T3724072
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