O QUARTO PODER
Desde muito cedo aprendemos na escola que os países democráticos, seus estados e municípios estão organizados, politicamente, na forma de três poderes: executivo, legislativo e judiciário. O que poucos sabem é a que e a quem devemos isso.
A coisa toda começou após a humanidade ter conseguido sair da Idade Média, que durou aproximadamente mil anos, desde a desintegração do império romano do ocidente no ano de 476 d. C, até a Queda de Constantinopla em 1453. Esse período ficou conhecido como “Idade das Trevas”, talvez em alusão ao perigo que significava expor pensamentos: ser julgado pelos Tribunais da Inquisição e acabar em suas fogueiras.
Então, no século XVII, surgiu, entre a burguesia europeia, um movimento intelectual defendendo o uso da razão (luz) para se alcançar qualquer tipo de conhecimento, pregando a liberdade (econômica e política), a igualdade e a fraternidade: o Iluminismo.
Um dos pensadores que se destacaram nessa época foi o matemático francês René Descartes (1596-1650), considerado o pai do racionalismo, da dúvida hiperbólica e do método cartesiano. Em sua obra “Discurso do método”, ele recomenda que, para se chegar à verdade, duvidemos de tudo, mesmo das coisas aparentemente verdadeiras, pois a partir da dúvida racional é que poderemos alcançar a compreensão do mundo e até mesmo de Deus.
Finalmente chegamos ao sujeito que instituiu a ideia de três poderes: Charles de Montesquieu, nascido em uma família francesa nobre, em 18 de janeiro de 1689. Ele fez isso mais ou menos em 1748, a partir de sua obra “O Espírito das Leis”, baseada nas ideias de John Locke (“Pai” do empirismo), embora tal separação tenha sido primeiramente mencionada pelo filósofo grego Aristóteles.
Suas ideias visavam a evitar o absolutismo monárquico, ou seja, que o poder não ficasse centralizado nas mãos de uma só pessoa. Por isso ele propôs a criação de três poderes independentes, de igual valor e com funções específicas: o Executivo, o Legislativo e o Judiciário.
Dessa forma, o primeiro é exercido pelo presidente, pelos governadores e pelos prefeitos, mas também por reis ou primeiros ministros, dependendo do sistema de cada nação. Esses têm a função de administrar os interesses da nação e de direcionar o povo. Bem, deveria ser assim, mas há uns que acham que a boa divisão é “um pãozinho para o povo e muuuitos brioches para mim”.
O segundo é inerente ao congresso, ao parlamento, às assembleias ou às câmaras e tem o dever de elaborar leis para a sociedade em geral, visando a que não haja diferenças entre um grupo e outro. Também acumula a função de fiscalizar o Poder Executivo verificando a veracidade de orçamentos públicos, licitações, contratos firmados e ainda a contratação de funcionários públicos. Deveria ser assim, mas sabemos que há aqueles que não fazem nada disso, caso não simpatizem com o chefe do executivo.
Já o Poder Judiciário é direcionado aos magistrados incumbidos de julgar fatos e conflitos ocorridos em consequência de alguma lei estabelecida pelo Poder Legislativo e aplicá-la, decidindo de forma imparcial e baseada em provas, quem está com a razão e quem deve ser punido. Não sou ingênua de afirmar que todos ajam dessa forma, mas... deveriam!
Considerando as farpas trocadas recentemente entre o ex presidente Lula e o ministro do STF, Gilmar Mendes; e considerando a corrida louca, desenfreada e pouco ética a que assistimos toda vez em que há eleições para cargos executivos, legislativos ou judiciários; sou forçada a fazer algumas perguntas a Montesquieu:
“Daí onde você está, é possível ver que os chefes supremos dos três poderes ‘se acham’ e têm privilégios bastante distantes dos pobres mortais que os elegeram? Foi você quem pregou que nós podemos eleger os líderes do executivo e do legislativo, mas que não nos seria permitido eleger o do judiciário? Você previu as alianças perversas que são feitas nos bastidores, visando à assunção do poder? Na época, por que você não anteviu que o comportamento afetivo pré-eleitoral seria mudado por muralhas de guarda-costas no pós-eleições? Será que os ‘gangsters’ mencionados pelo Gilmar Mendes, em seu desabafo, não estão encastelados nos três poderes?”.
Se as respostas forem “sim” para todas essas perguntas, então, melhor trocar o nome de Montesquieu para Maquiavel, embora eu considere este último um... “cagão”. De fato, penso que precisamos acordar, mas por meu temperamento antiviolência, não prego que façamos como os franceses que, em 14 de julho de 1789, tomaram a Bastilha e acabaram passando o “cerol” em Luiz XVI e sua esposa Maria Antonieta, em 1793. Defendo a inclusão de um novo poder, capaz de evitar a degradação dos demais: o poder da educação.
Não sei se sua sede seria o MEC, mas sugiro o critério essencial para ocupação de todos os cargos: ser educado! Reconheço a relatividade disso, pois muitos pensam que são, mas efetivamente não o são. Portanto, nesse ponto, é importante não confundir polidez com educação. A primeira está contida na segunda, mas não é suficiente para dirigir um poder capaz de transformar o bicho bípede em humano.
Talvez os candidatos aos cargos do 4º Poder tenham de ser submetidos a provas teóricas e práticas, onde a ética seja testada, mas antecipo o problema da escolha de quem avaliará os elaboradores das avaliações, pois eles, no mínimo, deverão ser exemplos do que pregam. Talvez por isso esse poder ainda não tenha sido verdadeiramente reconhecido e consequentemente instituído.