PARANAPIACABA

PARANAPIACABA

(De onde se vê o mar)

¨O sino bate, o condutor apita o apito,

Solta o trem de ferro um grito,

Põe-se logo a caminhar...

Vou danado prá Catende,

Vou danado prá Catende,

Vou danado prá Catende,

Com vontade de chegar...¨

Assim começa um dos mais belos poemas do poeta Pernambucano Ascenso Ferreira que conseguiu colocar nos versos escritos, a mesma cadência da máquina conhecida como Maria Fumaça, que o compositor Paulista Heitor Villa Lobos colocou na composição Bachiana nº 2 – O trenzinho do caipira. As duas obras se completam na recriação daquilo que foi o grande marco no transporte de cargas e de pessoas nesse Brasilzão dos dois últimos séculos.

Para solucionar o problema do deslocamento das riquezas produzidas no interior paulista até o porto de Santos, foi criada a estrada de ferro São Paulo Railway que ligava as cidades de Jundiaí no interior e Santos no litoral.

Mas havia e ainda há a Serra do Mar.

Esse gigante de rocha maciça que precisava e foi transposta pelo engenho e arte de homens determinados.

A penosa construção, os obstáculos físicos e o clima hostil foram atacados de frente e para que houvesse um local de descanso desses heróis anônimos, nasceu a Vila de Paranapiacaba.

A influência inglesa na construção da vila fica patente ao primeiro olhar.

Diferente dos portugueses cujas construções eram feitas ligadas umas às outras em ruas estreitas para oferecer proteção aos moradores, visto que a Península Ibérica sempre foi alvo de invasões, os ingleses, que sofreram a última invasão da ilha na época do Imperador Romano Júlio Cesar, constroem suas casas privilegiando espaços entre as construções, ruas largas, parques públicos e jardins floridos nas frentes das casas construídas com tábuas justapostas, onde portas e janelas (sem grades) se abrem para fora e são guarnecidas com cortinas coloridas.

Assim é Paranapiacaba.

A vila dos operários, as casas dos engenheiros e chefes de trens, o enorme pátio de manobras, o relógio (réplica do relógio do parlamento londrino), a casa do engenheiro chefe encarapitada no ponto mais alto da vila, nos leva de volta a um passado de esplendor.

Estamos a oitocentos metros acima do nível do mar e para vencer esse primeiro e grande desafio foi instalado o sistema funicular onde uma máquina enorme, a vapor, com capacidade para deslocar 120 toneladas, ajudava as subidas das composições através de cabo de aço até o dia em que foi substituída pelo revolucionário sistema de cremalheira que consiste no acoplamento de uma roda denteada da máquina, com os dentes de um terceiro trilho fixado no meio dos outros dois, por onde deslizavam as rodas da máquina e dos vagões.

Mas o tempo passou...

O progresso chegou e com ele as autoestradas, os caminhões, os maus políticos, os propineiros, os conchavos, os acordos sórdidos para enriquecimento ilícito e todo esse patrimônio sócio cultural está abandonado, exposto à deterioração pelo rigor do clima e da ação predatória de ladrões que roubam as peças, que são verdadeiras obras de arte, para vender a “colecionadores” e com o dinheiro, comprar as drogas, que são a fonte de renda dos magnatas controladores do poder público e o maior flagelo da nossa débil sociedade.

Um pequeno grupo de idealistas mantém a Associação Brasileira de Preservação Ferroviária e os componentes da Regional São Paulo, utilizando um vagão de 1914, puxado por uma máquina (Maria Fumaça) de 1860, nos levam a um ponto qualquer do passado, numa viagem de curtíssima duração, mas com imenso significado, a fim de juntar fundos para a recuperação do patrimônio que ainda resta.

Mas quem mais vai se importar com o passado histórico?

Prá quê guardar aquelas porcarias velhas?

Afinal estamos no século XXI, onde o bom da vida é... Nenhuma...

Ouvir sinos e apitos de trens com os nossos ouvidos devidamente preparados para ouvir funk...

- cantar “ai se eu te pego”...

- pichar a marca da tribo nos muros alheios e prédios cada vez mais altos...

- matar aulas...

- fazer tatoo nos locais mais inusitados...

- colocar piercing...

- vestir roupas rasgadas, desculpe, costumizadas...

- ser canabista...

- Vai um bagulho aí?

- Tá ligado?