Em homenagem a ela (aquela cretina)
A gente faz cada coisa ridícula pelas mulheres. E faria de novo, se preciso fosse, mas só quando recobrar aquele meu dom, que hoje chamo de inhaca, de simpatizar com ancas largas e ter um furtivo tesão por olhos cor de esmeralda. Do contrário, todo romantismo é em vão, como esse texto o é.
Esta é uma típica crônica a lá “prisão em flagrante” – eu tenho o direito de publicar nada e tudo que nela consta um dia poderá ser usado contra mim – e no futuro, quando a evolução da humanidade chegar a seu ápice (sem as músicas do Michel Teló e com travestis fazendo o serviço completo – barba, cabelo e bigode) até irá compor um amplo estudo de compreensão do pensamento feminino. Ou será considerado apenas um desabafo de um bom rapaz, cumpridor do que definiam as convenções morais, que se desenganou e virou boêmio, frequentador do pior tipo de lugar que já existiu no imaginário das tias fazedoras de cuecas-viradas.
Mas acredite o caro leitor que me defino melhor na escrita que nas ações. Sou pouco pragmático, apesar de monogâmico. E mesmo não aparentando, tenho segredos tão sem importância que derrubariam presidentes e outros mais relevantes capazes de me fazer odiado pelos defensores dos direitos dos animais. Mas um, em específico, preservo com muito zelo e interesse, tamanha sua sordidez. É confissão medonha, sem-vergonhice desregrada. Fariam qualquer gringo soltar um “porco Dio” na frente dos filhos. Pois é, sou meio romântico, escrevo poesias... para mulheres. E ainda entrego-as. Sujeira da grossa, baixaria sem regulamento. Poderia ser julgado por crime doloso, mesmo sem intenção de matar.
Viu só o que faz alguém que anda por aí com um canivete na bainha e cospe fumo mascado atrás do fogão? Essa gente me assusta. É capaz até de roubar flores do jardim da casa do tio João, o nego mais mal encarado das bandas de Secção São Miguel. E não duvido as vezes que acordou cedo, refez caminhos, calculou horários, divagou o futuro da humanidade, conversou com imagens e desprendeu tempo pra fazer planos estrategicamente elaborados parecerem obras do acaso à algum exemplar feminino. Gente criada pelo moralismo da nona, e capaz de entregar flores a uma mulher, dá nisso: não tem caráter, nem dignidade, tampouco decoro.
Mas essas práticas inescrupulosas um dia acabaram. Muito engraçado e muito esquisito. Fui pego de contrapé por um velho Nobel da Literatura, que, assim como este impotente locutor, deve ter recorrido à suas putas tristes por levar um chute em sua bunda alegre. Garcia Márquez compreendeu, e o disse, “que a força invencível que impulsionou o mundo não foram os amores felizes, mas os contrariados”. O nono Paulo, quando vivo, me aconselhava a nunca pechinchar com mulher da vida e nem perseguir as da morte. “O que é do burro vem no cocho”, dizia. No caso, o burro era eu.
Tomei consciência, enfim, da minha pequenez, única qualidade que tenho a proclamar. Diante dessa reordenação filosófica, os frequentadores de bodegas que jogam a família no truco, mijam na parede esquerda do estabelecimento e gargalham com suas goelas envelhecidas em barris de Carvalho são mais verossímeis que este babuíno que vos fala. Pra mim, foi uma escola. Ali não preciso oferecer flores pra ninguém e hoje as poesias que escrevo não são de martírio, mas de xucrismo e putaria. Obrigado por isso, mulher.
Mas aquele nó que trago no peito desde guri, quando ainda roubava flores, o nó que também vai me matar, é o que vai me prender a você até o dia do seu último suspiro inútil e asfixiado, sua cretina.