COMO UMA ONDA

e souza

É um desafio e tanto ficar no bar quando não se tem mais nada interessante para fazer e principalmente quando o banquinho é do tipo “meia bunda”, porque lá pelas tantas e tantas loiras vazias ou quase cheias desfilando naquela passarela de apenas trinta e cinco centímetros de largura, a gente começa a escutar diálogos incríveis, quanto aos banquinhos, bem, os mais distraídos não conseguem ficar muito tempo sentados e o quê se vê é um balé esquisito, um senta levanta e olhando de perfil fica até bonita aquela coreografia tipo onda, quando um desce outro sobe, têm os que ficam outros que não aguentam e se vão, e se vão é porque o trazeiro já se foi. Em um dado momento e após muitos “bebes” e pouco “comes”, uma senhora passou a repetir e não é só o “repetir”, mas dizer a mesma coisa por várias vezes à mesmíssima história, a diferença era a ordem, mas como “a ordem dos tratores não altera o viaduto” (nossa que coisa antiga), ela discutia sobre ter nascida na Cidade de São Paulo. “Eu nasci aqui, então eu sou paulista e não paulistana”, o companheiro de banquinho explicava com paciência “Você nasce aqui, então você é paulistana e se nascer no interior é paulista”. A mulher não aceitava de maneira alguma. “Eu não quero ser paulistana, eu nasci aqui, não entendo, não quero ser paulistana eu sou paulista”. A discussão era intermitente (não sabia que essa palavra fazia parte do meu vocabulário), não sei você, mas ficar ali escutando aquele monólogo entediante me fez escutar outro não menos pior. “Sabe de uma coisa? (dizia um sujeito que falava muito rápido e algumas palavras eram incompreensíveis). “ Outro dia fui na casa da minha ex mulher, a Soninha, lembra dela? Ela trabalhava naquele salão de beleza da goiabinha, a Maria da Luz, ela era casada com o bene trepadeiro, mas não tinha filhos, dizem que ele trepava nas árvores da rua e procurava sempre as mais altas e numa destas ele caiu de perna aberta em cima de um galho e daí já sabe né? Ele não tirava do pé um chinelo de dedo que tava fininho de tanto usá, chinelo bom aquele, tinha um ator de TV que fazia propaganda, o cara fez o filme lá do Carandiru e ele era um tremendo “travéco” simpático, até casou na cadeia onde trabalhava aquele médico da TV, mataram lá 111 presos, tinha gente que dizia que era muito violento, mas é porque não viram ‘Faces da Morte’ nem ‘Jogos mortais’ esses sim que mostrava sangue de verdade, eu comprei um piratão do Zé lá da praça perto do metrô, ele fica do lado da barraca do Jailson que é filho único do Jesus, ele trabalhava lá no sacolão do Brás perto da onde comprei meu cel que é uma porcaria, não consigo fazer nada com ele, a única coisa que faço é ouvir música no rádio dele. Lembra do Vanderson? Pois é, ele mancava, era filho da Luzia que é surda, não lembro de que perna, dizem que quando era menino pequeno caiu do muro do campinho e... Joguei bola lá com o pessoal. As mancadas é porque teve doença no joelho e que foi descendo pra canela e depois foi pro pé e do pé pro dedão e até parou de usá chinelo de dedo, porque perdeu o dedo. Do quê mesmo tava falando? Ah, lembrei! Eu fui na casa da minha ex mulher, a...” Gente daí quem não aguentou fui eu. Fui

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E Souza
Enviado por E Souza em 11/06/2012
Reeditado em 26/07/2014
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