A Colecionadora
Liza, como Elizabete era chamada pelas amigas, não passava de uma mulher comum, que levava uma vida comum, com um emprego comum e muitas atividades comuns. Adorava colecionar coisas, colecionava conchinhas que encontrava na praia, pequenos enfeites comprados em lojinhas de um e noventa e nove, mas o que gostava mesmo de colecionar eram partes de corpos. Gostava tanto desse hobbie que tinha uma sala em sua casa destinado a ele. Toda vez que uma amiga sua visitava seu apartamento adorava mostrar todo o cuidado que dispensara para organizar aquela coleção. Gabava-se por ter sido ela mesma quem cortara cuidadosamente cada parte dos corpos e suas amigas ficavam impressionadas com o quão formosa era sua coleção. Reunidas na sala, as mulheres riam maravilhadas das prateleiras recheadas de partes humanas. Umas diziam “acho que vou começar minha própria coleção”, outras “eu tenho um baço sobrando, você está a fim de trocar por esse pulmão?”. Elas se impressionavam mesmo ao ver uma prateleira com vários anulares claramente masculinos ainda com alianças de casamento. Eles formavam um degrade de pele em decomposição. “São dos meus maridos”, dizia Liza quando uma amiga parava para observar a prateleira, “esse foi meu primeiro marido” e apontava para um dedo em riste preso numa base de madeira com um pedaço do osso já aparecendo sob a pele acinzentada. Uma prateleira em especial levava a suspiros envergonhados das amigas de Liza e também a alguns comentários engraçadinhos.
Um dia, quando seguia para o trabalho, foi parada por excesso de velocidade. O guarda logo percebeu a orelha decepada que balançava de um lado para o outro presa ao retrovisor.
- O que é isso? – perguntou ele.
- É a orelha do meu ex-marido…
O guarda pensou um instante.
- Então você é solteira?
Liza lhe entregou seu “sim” com um meigo sorriso. Tempos depois, o guarda fazia um lindo pedido de casamento ajoelhado na bela sala da coleção de Liza, ele também admirava o empenho da amada ao cuidar do próprio hobbie.