Quero ficar velha

Quero ficar velha!

Estava comprando um perfume para meu marido dia desses e a vendedora, uma senhora bem bonita na faixa de seus 55 anos que estava me atendendo, perguntou o motivo do presente.

Comentei que era aniversário de namoro, estávamos comemorando 19 anos juntos, entre namoro e casamento. Ela me parabenizou e disse:

- AH! Essas datas eu comemoro, mas meu aniversário não mais. Inclusive, pedi para todos esquecerem, pois até eu já esqueci; depois de certa idade nem queremos mais saber de fazer aniversário.

Olhei para ela e respondi:

- Eu não quero deixar de comemorar meus aniversários, pois eles são os sinais de que estou viva e, portanto, não morri jovem! Quero apagar 90 velhinhas com muita alegria!

Ela então me olhou com certa surpresa.

_ Puxa! Nunca havia pensado dessa forma, na realidade, nós mulheres somos muito vaidosas e a velhice é um horror para nossa beleza, mas considerando isso que você falou, acho que vou comemorar meus próximos aniversários sim.

De fato, sei que o tempo é cruel com a matéria externa, nos traz rugas, a pele perde aquele frescor da juventude, aquela maciez e brilho, nosso andar se torna mais lento, nosso corpo se modifica em suas curvas e movimentos, alguns órgãos precisam de mais ajuda para funcionar. Assim como qualquer máquina, nos tornamos um modelo ultrapassado em design e performance em relação aos jovens de vinte e poucos anos.

Entretanto, acredito que mesmo obsoletos, podemos continuar funcionando muito bem se desde jovens tivermos em mente que a velhice é o destino de todos que não morrem jovens. Mas podemos ter uma velhice legal, eu já desejei a minha.

Uso o termo velhice mesmo, porque acho que esse é o nome. Que nos adianta terceira ou quarta idade, se no final das contas significa ter passado dos 60 ou 70 anos? A questão não é ser velho e sim antiquado ou cego para as mudanças e isso não tem idade certa, pois , conheço “jovens” de 25 anos que são inflexíveis demais para qualquer possibilidade de mudança, estão sempre presos às regras e conceitos pré estabelecidos pela família ou sociedade em que vivem.

Quero ficar velha sim! Quero cantar com força meu aniversário de 70, 80 e 90 anos, quero ter rugas, cuidadas com amor pelos cremes “antiedades” e com massagens relaxantes, quero ter cabelos brancos, livres das tintas que hoje uso, porque fiquei totalmente grisalha aos 25 anos e ainda (já perto dos 40 anos) não me sinto a vontade de parecer uma vovó, deixarei isso para daqui uns 20 anos.

Gosto de me imaginar vovó. Daquelas que lembram a personagem Dona Benta de Monteiro Lobato. Vovó mesmo, até porque tive filhos depois dos 30, então poderei ser vovó mais tarde do que as mães jovens.

Não quero ser do tipo dessas vovós modernas que querem ter um corpo mais “sarado” que o neto de 18 anos! Quero parecer vovó de verdade, cabelo branco bem cortado (como a atriz Meryl Streep em “O Diabo veste Prada”), corpo esguio e forte apesar de tudo ter sofrido com a ação da gravidade e me obrigar a usar umas “cintas de segurança” para barrigas e seios enfraquecidos. (para isso serve a tecnologia dos lingeries!) E daí, que as curvas mudaram de lugar no meu corpo? Não vou ficar desfilando pelada pela Sapucaí no carnaval, nem vão me oferecer milhões pela capa da Playboy ; nunca me ofereceram mesmo... que diferença fará?E daí que não despertarei mais olhares sedutores de garotões ou belos homens de 40 ou 50 anos? Terei meu marido, filhos, noras e netos felizes em minha companhia.

Quero enfim levantar às 6 da manhã achando que é a coisa mais normal do mundo! Afinal, dizem que na velhice dormimos menos. Puxa! Isso me preocupa, porque já durmo tão pouco; por outro lado é bem interessante, porque poderei ler e escrever mais e mais, já que sexo nessa idade (75 em diante) só para ocasiões ultra-especiais e prefiro usar essa energia para coisas mais produtivas que orgasmos múltiplos... Apesar de que eles são bem úteis para manter o brilho na pele e o coração pulsante!Talvez reveja ainda essa questão de fazer tão pouco sexo. Melhor manter uma média mensal para garantir a saúde física, mental e do casamento.

Irei à feira semanalmente e farei supermercado feliz e sem pressa, afinal o tempo estará a meu favor! Estarei comemorando 80 anos!

Vou aprender os ofícios das avós: crochê, tricô e ponto cruz! Quer algo mais lindo do que vovó de óculos fazendo um lindo bordado na toalha do neto? Ou uma blusinha para o inverno? Ou ainda, um crochê básico naquele guardanapo comprado às pressas numa loja qualquer?

Quero ficar uma velhinha que mantêm atividade física diária para o bem estar das articulações, mesmo estando doloridas ou “enferrujadas”, pois, não há coisa mais chata nesse mundo do que velho que só porque é velho só sabe falar das coisas óbvias da velhice que são as doenças ou enfraquecimentos naturais dessa máquina chamada corpo.

Dores nas articulações, enfraquecimento ósseo, perda da acuidade visual, alguma doença metabólica, isso é esperado para máquinas com tantos anos de vida, mas não é por isso que só vamos nos preocupar com essas coisas. Para tudo isso existe remédios e bons tratamentos.

Adoro conversar com pessoas velhas que enxergam a vida como algo sempre em movimento, com a crença eterna de que algo novo pode acontecer a qualquer momento, que efetivamente acreditam que o aprendizado nunca acaba. Isso é SER VIVO! Não importa a idade cronológica.

A velhice é a parte da vida que não precisamos mais temer pela vida, pois os filhos já cresceram e a profissão não acaba nunca, mas já nos sentimos mais tranqüila com ela, enfim, o que fizemos ... fizemos, não muda muito mais. Uma compra extra, um novo curso, mas nada de tão modificador do que já somos.

Isso deve ser o sentimento da mais absoluta liberdade! Liberdade para simplesmente acordar e viver....sem prazos tão rígidos a seguir, sem tantas preocupações com o amanhã, porque o amanhã será sempre mais um dia de comemorações por estarmos vivos e com a possibilidade de aprendermos algo a mais, enquanto essa vida terrena ainda tiver algo a oferecer, porque quando isso se esgotar, enfim estaremos prontos para aprender a mais profunda e intensa lição da vida, morrer na Terra para nascemos no Céu. Isso para àqueles que acreditam na fé que Cristo pregou.

Eu acredito!

Susana Bueno de Souza.

(Dedico esse texto a duas “velhinhas” que muito admiro, minha avó Nina e Dona Josete Feres que é dona da Escola de Música de Jundiaí e com muita alegria de viver comanda com absoluta maestria o curso de musicalização infantil, curso o qual meus filhos têm o privilégio de serem alunos.)( Esse texto foi escrito em outubro de 2007, infelizmente, um ano depois minha avó faleceu, exatamente em 01/11/2008)

Susana Bueno
Enviado por Susana Bueno em 06/06/2012
Código do texto: T3709255
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