O eu de si e o eu dos outros
Tentando escrever alguma coisa, logo adoto o automático crivo da autocensura, seja usando os mecanismos da empatia, isto é, o da identificação que suponho que o leitor teria com o texto, seja procurando as melhores palavras para exprimir, de forma mais universal, uma ideia que considere “partilhável”. A verdade é que vivemos intensamente de milhares de convenções e de códigos de comportamento social. Perdemos a noção (existem exceções) do que realmente faríamos/diríamos/escreveríamos, não fossem as tais regras que temos que seguir. Quanto mais forem impessoais as relações que “nos obrigamos” a manter tanto será o nosso grau de desvio. Por ser comum a quase todas as pessoas, esse tipo de reflexão é lugar comum, um drama que pontua nosso dia a dia.
Quantas vezes não sorrimos para alguém que, se não detestamos também não chegamos a simpatizar. É como fazer o que não se gosta por dinheiro, por consideração a outrem ou porque não queremos administrar um eventual desconforto que será mais amargo que este “investimento” como consequência de uma autenticidade tida como excentricidade pelo círculo em que vivemos. Então, vamos nos distanciando de nós. Aquele que emite, cria, origina pensamentos que os vetos da convivência cerceiam, podam ou sufocam completamente. Tornamo-nos outras pessoas. Uma versão lapidada, adaptada, hibrida por que o que interessou foi a sobrevivência segundo as regras pré-estabelecidas. Por outro lado, quando se é original (ou o mais próximo disso) e se possui um talento obvio, criam-se novos rumos e, não raro, inserem-se formas novas de enxergar o mundo deixando rastros e fazendo escola.