Aurora, eclipse e ressureição.

Eu era puro,contemplava o mundo cheio de inocência,para mim todos eram bons e sendo assim jamais pensei que pudesse existir corrupção.

Quando a conheci a primeira coisa que me chamou atenção foram seus olhos,gandes castanhos e doces...Cheios de uma expressão que era impossível de decifrar,eu tinha apenas cinco anos,mal conseguia articular duas idéias na cabeça,hoje penso que também não consiga.Talvez seja a idade ou a mente que fica preguiçosa pela vida que segue sem grandes realizações. Quando te olhei pela primeira vez perdi a respiração e sorrindo você se voltou para mim e perguntou o que estava olhando,eu nem respondi,saí correndo sem ar. Tropecei caindo de cara, os outros em volta riam,nãome importei levantando sacodi a poeira dos joelhos e voltei para sala. Acredito que o tempo passou e aquele dia terminou comigo lembrando dos seus olhos sem me dar conta. Aquele ano não foi tão ruim quanto os outros e eu te vi ainda muitas outras vezes no recreio mas eu ficava mudo quando estavamos frente a frente e você ia embora e eu me sentia um derrotado...

Passei de ano,fiz amigos equase deixei de arrastar o fantasma da timidez,quatro anos depois eu já sabia o que era,ficava vermelho com qualquer coisa na verdade eu era bem pateta. Não sei se por pirraça do destino ou se normalidade até ali nunca estivemos na mesma classe, aos onze anos isso mudou, clima bom,mesma sala nomes com quase as mesmas letras éramos os primeiros na chamada e por dentro várias vezes me peguei tremendo quando chamavam seu nome e antes do fim daquele ano nos tornamos amigos,eu me distraía olhando e querendo outras garotas,na descoberta do primeiro beijo e das primeiras decepções,sendo amigos trocavamos muitas confissões e confidências e umas mentirinhas que te contava pra impressionar você escutava tudo atenta me dava conselhos e ria me revelando muito da natureza de uma mulher que não mudou tanto com o caminhar ora lento ora acelerado do tempo. Crescíamos vertiginosamente mas ainda se podia apreciar certas coisas que hoje é dificíl, a compahia dos amigos uma noite de luar brincando de barra bandeira e escondido ouvir os discos de rock importados dos meus pais. Até o dia que você veio a mim dizendo que gostava de um menino e que ele tinha lhe dado uma flor e queria que fosse sua namorada,fiquei cego com dois palavrões te dispensei da conversa e fui ter com meu rival,dei-lhe uma surra,bati tanto que fiquei cansado e talvez muito mais dolorido que ele mas não esqueci a artimanha de lhe ameaçar que se revelasse quem lhe tinha partido a cara lhe arracanva agora o couro e a língua. Coitado do cara até hoje deve achar que sou um psicopata, eu, tão calado metido com meus livros e peripércias que são melhores se praticadas a sós para serem apreciadas assim no escuro, na surdina,parti pra cima dele como uma besta ensandecida,seria ciúme ou despeito por ele ter tido mais coragem e ousadia que eu? Você se afastou de mim mas concertei tudo com uns bombons e revistas de moda pra moças que fingi ser por seu aniversário. Namorei também,talvez mais de uma menina por semana ou por dia e outras tantas vieram mas nunca com o mesmo brilho a galhardia de alguém que se atirava sem pensar nas brincadeiras mais esdrúxulas e perigosas, uma roupa rasgada aqui, uma mancha de lama ali uma pedrada por roubar goiabas... Terminamos o ginásio,veio o colégial ainda amigos mais meio frios, essa distância comportada que é imposta aos sexos pela sociedade e no fim não passa de hipocrisia porque me lembro de muito pai e mãe de família da nossa rua que vivia mais que nós o Carpe Diem. No último estavamos quase só como conhecidos nenhum traço do moleque travesso e da menina faceira companheiros de tantas driabruras e colas de teste de matemática passados por baixo da carteira,cada um foi para faculdade de escolha,outros por merecimentos uns por dinheiro mesmo e eu tive que te esquecer por um tempo enquanto via de novo o mundo dando voltas agora sem inocência mas com aquela esperança que castiga e acalenta o coração dos sonhadores. Vivi na poeira do vento,na neve e na chuva até encontrar minha esposa que me fez conhecer profundamente o significado de duas palavras; desejo e desespero.

Desejo;porque queria estar com ela para sempre.

Desespero; por perde-la tão rápido e tragicamente que a vida e as obrigações a que tinhaq eu me apresentar não me deixaram sentir tanto, enterrava minha cabeça no trabalho e nos filhos.

Sim, filhos tenho três,cada um carrega um pouco de nós sendo totalmente diferentes entre si e amados com igualdade,tendo caminhos os caminhos que escolheram são felizes agora fazendo a própria estrada. Esses dias te vi e você já uma senhora e como eu fui você pode ou não ainda ser casada,talvez até com aquele palerma da flor mas tú tens os mesmos olhos e o temperamento incendiário que quando te encarei fiquei de novo mudo e o tempo que é tão confuso dando e tirando tudo ao seu bel prazer juro que não estarei assim pra sempre,eu finalmente compreendi que és o grande amor da minha vida. Eu deixarei o medo e as lembranças de lado para me arriscar por você e não importa se não me corresponder ou me por pra correr me chamando de velho tarado pelo menos eu vou me livrar dessa veste de covarde que usei a vida inteira porque ele, o tempo me ensinou que não existem amores impossiveís,há sim pessoas incapazes de lutar por aquilo que é parte de si e precisa ser recuperado e vivido. Eu não quero mais passar a vida escondido de um amor que certamente valeria a pena porque todo tipo de amor existe e só ele é capaz de curar,construir e ressucitar. Esta crônica foi baseada numa entrevista que vi numa dessas madrugadas em que um senhor diz ter tido um único amor na vida e o perdeu, a poucos dias a tinha reencontrado. Serviram de trilha e inspiração também duas músicas que eu realmente amo: Solitary man de Johnny Cash e Sacrifice da banda London After Midnight.