CHECK-UP III

Na busca para fazer um exame que atestasse a minha sanidade mental, eu procurei um especialista. No caso, o Dr. Daury – famoso neuropsicólogo, escritor e professor.

Porém, para saber mais sobre o que é “Sanidade Mental”, eu fui pesquisar o termo e encontrei, na Wikipédia, com palavras simples, o que ela significa. “A saúde mental (ou sanidade mental) é um termo usado para descrever um nível de qualidade de vida cognitiva ou emocional ou a ausência de uma doença mental. Na perspectiva da psicologia positiva ou do holismo (holismo é a ideia de que as propriedades de um sistema, quer se trate de seres humanos ou outros organismos, não podem ser explicadas apenas pela soma dos seus componentes. O sistema como um todo determina como se comportam as partes), a saúde mental pode incluir a capacidade de um indivíduo de apreciar a vida e procurar um equilíbrio entre as atividades e os esforços para atingir a resiliência psicológica”.

Entretanto, no mesmo site, observei que a Organização Mundial de Saúde afirma que não existe definição "oficial" de saúde mental. Diferenças culturais, julgamentos subjetivos e teorias relacionadas concorrentes afetam o modo como a "saúde mental" é definida.

Assim, munido de um conceito que me deu uma visualização daquilo que é importante para o meu futuro profissional – apesar de saber que “de artista e louco todo mundo tem um pouco”, eu fiz o primeiro teste (descrito na crônica da semana passada) e vi que não é tão fácil, diante do exercício, observar, com clareza, a diferença entre a realidade e a imaginação baseada nas lembranças.

Em seguida ao primeiro teste, uma outra folha foi colocada. Desta vez eu tinha que desenhar uma pessoa. Sabe, eu ri (acho que não fui muito são neste momento) e pensei: pela sua complexidade e diversidade, como pode uma pessoa, no seu devido juízo, desenhar um “ser humano” sem, de certa forma, comprometer a observância rigorosa do que representa a Criação de Deus?

A princípio, por ser fruto da percepção real de que existem estereótipos, em nosso imaginário, baseados na figura humana, e que, partindo da cognição que nos permita fazer algo que seja definido como “ser humano” – numa folha de papel –, eu simplesmente desenhei a imagem depositada em meus arquivos – da pasta “lembranças” – do mesmo desenho que fazia quando ainda estava na pré-escola (não tenho bem certeza, mas acho que o doutor deve ter me tirado uns dez pontos nos quesitos: equilíbrio, proporcionalidade, comparação, estética, coordenação e criatividade) e associada à figura do “cowboy” dos filmes de faroeste (sem os coldres, os revólveres, as botas, o blusão e o cinto de fivela, claro! – como disse, o desenho permanece na minha imaginação há mais de 45 anos).

Quando terminei, eu olhei para as duas folhas. Pelo que estava feito ali, o teste estava se encaminhando para, no mínimo, uma internação temporária, somente para um reajuste no equilíbrio emocional. Mas, persistente que sou, fui para o terceiro teste: desenhar uma casa. Novamente a lembrança da casinha de taipa. Mas, como era um desenho, eu dei uma melhorada na “casinha” de minha infância. Porém esqueci de colocar o teto dela (neste momento, eu dei uma olhada para o doutor e acredito ter visto, em seus olhos, uma expressão de reprovação. No entanto, se eu estava começando a imaginar isso, isso significava que eu podia estar passando a achar que ele estava me perseguindo, pois aquele olhar sereno, parado, olhando diretamente para o que eu estava fazendo, não podia ser coisa boa) e, acredito, faltou, também, o pé de cajarana, o sol acima da cumeeira, o caminho que trazia as pessoas até a porta dela; enfim, aquilo jamais poderia ser comparado a um desenho de uma casa "real" – pelo que estava rabiscado ali –, mas, em contrapartida, no mínimo, um interessante caso de absoluta falta de aptidão na arte de desenhar.

Assim que lhe entreguei a folha, o abnegado pesquisador me passou às mãos uma outra folha contendo umas 50 perguntas das mais variadas possíveis. É claro, todas relacionadas com transtornos e suas variantes. Confesso que “escorreguei” em algumas delas. Explico: é que tinha pergunta tão “boa” de responder que eu achei que não devia mentir.

Quando acabei – depois de uns trinta minutos – e achei que, finalmente, ia receber o atestado avalizando que eu sou normal, o ilustre profissional “puxou” outra folha com mais umas 100 perguntas (com todo o exagero) e ele mesmo foi perguntando. Por incrível que pareça, achei melhor. Não dava tempo de querer mudar as respostas. Aliás, essas eram relacionadas com a perda do controle emocional e, consequentemente, o que isso traz.

Terminada a bateria, ele guardou todo o material usado nos testes e me disse que eu voltasse no dia seguinte para apanhar o resultado. Ainda insisti que precisava saber o resultado imediatamente, para ter certeza de que ia poder viajar e passar na Junta Médica do Estado, mas não teve jeito: somente no dia seguinte eu teria acesso ao "laudo".

Saí do consultório achando que o mundo me odiava; que as pessoas estavam tramando alguma coisa contra mim; que o fato de o doutor não ter me dado o resultado na hora só podia significar que ele não tinha ido com a minha cara. Afinal, eu sou normal!!!

Dia seguinte, cheguei no horário estabelecido para receber o resultado. A atendente, porém, disse-me que eu fosse apanhar o resultado num outro lugar (quando ela disse isso, eu olhei de lado para ver se tinha, por perto, aqueles caras de branco segurando uma camisa sem que o dono estivesse dentro dela), pois o doutor tinha, por motivos outros, deixado em seu escritório particular. Quando, concluindo, depois de ter ido ao local indicado pela atendente, eu, finalmente, vi o resultado, o sorriso se tornou radiante: segundo ele (eu não assino embaixo), eu estou apto para viver em sociedade por mais um tempo. Então, o primeiro pensamento foi: o mundo me ama, as pessoas são boas e o doutor é gente fina...



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Raimundo Antonio de Souza Lopes
Enviado por Raimundo Antonio de Souza Lopes em 03/06/2012
Reeditado em 19/04/2019
Código do texto: T3703074
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