Um dia de rato

Ontem vi um rato. Não era um daqueles que estou acostumado a ver todos os dias nas latas de lixo. Era branco como aqueles que os meninos e meninas gostam de ter em seus quartos para brincar. Fiquei diante dele por alguns segundos e aquele tempo me fez sentir um vazio enorme. Ele estava absolutamente concentrado em seu “caminhar” que consistia em ficar pulando de um lado ao outro dentro da minúscula gaiola. O engraçado é que ele não percebia que passava a todo instante no mesmo local e da mesma forma e velocidade. Aquele ir e vir era por demais óbvio, pelo menos para mim. Tentei por diversas vezes chamar sua atenção: assobiei, estalei os dedos, fiz psiu e até gritei. Nada deu certo, ele estava mesmo do outro lado da grade.

Caminhei alguns passos com aquela imagem dentro dos meus pensamentos, como se minha caixa craniana fosse a própria prisão daquele (in)feliz quadrúpede. Assim foi que descobri que também eu posso não passar de um bicho desses, um pouco diferenciado nos hábitos, pois me levanto, escovo os dentes, vou até o carro, dou a partida, chego ao trabalho e me sento. Essa é a minha rotina diária... o meu espetacular caminhar.

Pensando bem é possível que você não seja um irresponsável como eu. Sinceramente torço para que não o seja. Esta é a única possibilidade que tenho de conseguir minha total liberdade. É bem verdade que a porta da minha casa está fechada. Ultrapassá-la me parece um ato complexo e de difícil conclusão. Vejo-a ali, fechada, mas transparente. Quem sabe você tem a chave?!

Algumas horas depois voltei onde havia visto o tal rato. Custasse o que me custasse, abriria a porta que lhe aprisionava. A mim só interessava vê-lo correndo, correndo mundo afora, mas in(felizmente), quando cheguei um menino, talvez o seu dono, já o havia libertado. Brincavam do lado de fora da gaiola. Conversavam como velhos amigos. Só não consegui entender qual era o idioma que usavam, mas sei que entendiam tudo... ou quase tudo!

Quando o menino cansou da brincadeira e foi embora, pensei que também eu poderia conversar com o pequeno animal, me aproximei e disse: oi. Ele não ouviu, falei mais alto e de nada adiantou. Olhei nos seus olhos, ele não me olhou, abri a porta da gaiola, ele não tomou conhecimento. Coitado de mim!

Pedro Cardoso DF
Enviado por Pedro Cardoso DF em 05/02/2007
Reeditado em 11/10/2017
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