Histórias de bichos 1

À Homero Vasquez

Gosto de ouvir histórias de bichos. Aqui no extremo sul procuro coletar algumas. Sobre a cobra parelheira existe uma narrativa popular que considero das melhores. Muitos comentam que esta cobra tem uma habilidade rara.

Manoelito bebia cachaça no bolicho quando começou a desfiar o causo da parelheira que andava assombrando a estância lá pelas bandas de Árvore Só. Sujeito guapo, criado nas lides do campo, pouco estudado, de pouca vivência longe do campo. Criava o primeiro filho com o esforço do trabalho braçal. Casou-se com Adelina e em pouco tempo lhe nasceu o primeiro filho.

Com algum esforço conseguiu com o patrão o direito de plantar milho perto das casas. Para complementar a comida, já que o salário se perdia na cantina e a comida não era farta. Criava algumas galinhas e após alguns anos conseguiu a caro custo uma vaca que lhe permitia sustentar o filho.

Adelina dormia com o guri de peito do lado, temendo a cobra parelheira. Conhecia o poder hipnótico desse réptil através das histórias do avô Serqueira. Serqueira. Convicto da visão de que andou frente a frente com uma grande parelheira mamando numa vaca leiteira no cair da tarde, justo quando a cerração começava a marear os olhos da noite. Foi uma cena aterradora porque o bezerro mugia desgraçadamente ao lado sem poder se alimentar. Como se não bastasse corria a fama de que essa qualidade de serpente ludibriava as mulheres que amamentavam. Tirava-lhes o bebê do seio colocando a ponta da cauda fina na boca do rebento, para se abeberar de todo leite materno.

Onde há milho, há serpente. Os ratos atraídos pelo milho e as serpentes pelos ratos. Era possível ver a alma atribulada daquele homem. Medo talhado na expressão da coragem fria. O medo conjugado em devoto silêncio pelo casal novo na tapera firme. Espécie de temor sem lampião no breu da imensa planura.

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