Um sonho preso a um anzol

Se não nos é dado permissão para enxergar do outro lado da abóbada que nos reveste, a ele sim, era permitido ver, ainda que de forma difusa, a luz que havia do outro lado da camada de gelo, que separava a superfície do fundo do lago. Um fundo de lago que era seu habitat, escuro, mas que ele conhecia como “a palma de suas barbatanas”.

Deixava-se levar pelos movimentos mais profundos das águas, assim como são levados os turistas; ao contrário de todos, via o abismo de baixo para cima e localizava-se nele, como se em casa estivesse, ou estava.

Conhecia grutas e fendas inacessíveis aos predadores, recantos paradisíacos, para onde levava sua amada, mentindo temer a proximidade do predador

Lá, no alfama dos sonhadores ele tinha um sonho, conhecer o outro lado do espelho, o que havia acima da crosta de gelo que o cobria. Lendas diziam que La havia mil temidos pescadores; que peixes eram colocados em latas e repassados a terceiros, latas como aquelas que sujavam o fundo do lago; mas um mundo que mostrava belezas também: outras espécies, minhocas em profusão e onde não se estendiam redes e quando as estendiam, as redes serviam apenas para balançar

Como se alguém houvesse acendido um holofote o raio de luz o atingiu e sem nunca ter ido ao teatro o facho de luz fez dele o protagonista. Um circulo foi serrado no gelo que cobria o lago e por ali passou a ceia que alimenta sonhadores, a última ceia, mas isto ele não sabia.

Descia em sua direção o alimento, preso a um gancho dourado, que os humanos chamam de anzol

Pensou que o preço da realização dos seus sonhos foi a dor que sentiu ao ser fisgado; a luz que viu através do túnel, não era só a luz que separa a vida da morte; a luz do mundo externo o ofuscou. Se perguntou: onde estavam as fendas e grutas para onde corre quando se vê ameaçado?

Que mundo era aquele em que se tornava necessária a luz para se enxergar? Lá no fundo ele a tudo via obedecendo suas emoções, instintos e sensações e, de imediato, percebeu que não queria ver apenas com os olhos... mas era tarde demais.

Roberto Chaim
Enviado por Roberto Chaim em 28/05/2012
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