O perdão
Eu aguardava atendimento em um consultório odontológico e comecei a ler a Revista Seleções. Quem tem esse tipo de vício não consegue ver um texto sem logo verificar de que se trata. E se envolve tanto com o assunto, que acha que a sua vez se ser atendido chegou muito rápida. Outra característica do bom leitor é o costume de pedir a revista para terminar de ler em casa... Ou ficar na sala de espera, após a consulta, por mais alguns momentos, terminando a leitura. Alguns mais acometidos pelo vício costumam carregar bloquinho e caneta para anotar alguma coisa...
Neste dia, vi um artigo escrito por Lisa Collier Cool, que achei muito interessante. Enquanto eu o lia, fiquei imaginando que aquele assunto precisaria ser mais divulgado. Afinal, há tanto sofrimento decorrente da falta do perdão. E a forma com que ele foi abordado certamente despertará mais interesse por se tratar de uma comprovação científica. E, assim, resolvi colocar em prática a minha intenção.
O Dr. Fred Luskin, diretor do projeto Perdão, da Universidade de Stanford, e autor de “O poder do perdão”, descobriu que se livrar de um ressentimento pode reduzir o estresse em até 50%. Ele diz que é muito tóxico carregar por aí uma bagagem de amargura.
As reações por que passa um organismo em uma situação de sobressalto é a seguinte: o corpo libera os hormônios do estresse – adrenalina e cortisol – que aceleram o coração e a respiração e fazem a mente disparar. Isso é fundamental para que a pessoa reaja diante desse tipo de situação. Ao mesmo tempo, a liberação de açúcar estimula os músculos e os fatores de coagulação aumentam no sangue. Tudo isso é inofensivo se o susto é leve. Só que a raiva e o ressentimento são como sustos que não têm fim e, assim sendo, esses hormônios se transformam em toxinas.
O Dr. Bruce McEwen, diretor do laboratório de neuroendocrinologia da Universidade de Rockefeller, em Nova York, diz que o cortisol esgota o cérebro, causando atrofia celular e perda de memória. Também eleva a pressão sanguínea e os níveis de açúcar no sangue, enrijecendo as artérias e provocando doenças cardíacas.
É aí que entra o perdão, que parece interromper a circulação desses hormônios. Portanto, perdoar aqueles que nos magoam pode trazer profundos benefícios, como controle da raiva, a redução do estresse e, talvez mais importante, a melhora da saúde. Luskin diz que resolve contrariedades “substituindo sentimentos hostis por sentimentos positivos, que fazem o corpo se acalmar e relaxar, melhorando a saúde”.
Numa conferência em Atlanta, cerca de 40 pesquisadores reuniram-se para analisar suas descobertas sobre o poder curativo da conciliação. Um fascinante projeto, realizado pela Campanha para a Pesquisa do Perdão, instituição sem fins lucrativos, utilizou ressonâncias magnéticas para investigar como apenas pensar sobre a empatia e a reconciliação ativa o giro temporal médio esquerdo, levando a crer na existência de um centro mental do perdão pronto para ser explorado.
O que mais me chamou a atenção foi o testemunho da vida de Betty Fergunson, que perdoou o assassino da filha. Depois do homicídio de Debbie, que tinha 16 anos, em 1975, Betty ficou tão deprimida que todas as noites bebia até dormir e negligenciava seus outros quatro filhos. Amaldiçoava o assassino Ray Payne, o professor de inglês da filha, que a seqüestrara e lhe tirara a vida. Mesmo após a condenação do assassino e a sua prisão perpétua, a sua dor não diminuiu. Ela sofria de dores nas costas, dores de cabeça e mal conseguia parar de pé. “O ódio estava me consumindo”, conta ela.
No ano de 1981, no funeral de sua irmã, um trecho do Pai-nosso a impressionou: “Assim como nós perdoamos a quem nos tenha ofendido”. Depois disso, ela começou a ler sobre o perdão e percebeu que talvez essa fosse a solução. Foi visitar o túmulo da filha e leu o que estava gravado na lápide: “Do que o mundo precisa agora é de amor”. Começou a repetir em voz alta, como se fosse uma espécie e mantra, as palavras: “Quero perdoar Ray”. Poucos meses depois, escreveu-lhe: “Cansei de sentir raiva de você. Posso ir até aí e compartilhar minha jornada com você?”
Em 1986 – 11 anos após o crime – Betty visitou o assassino da filha na prisão. Contou a ele o que Debbie significava para ela e o quanto havia sofrido. Ambos choraram. Ela disse: “Saí dali uma pessoa diferente: meu coração estava leve”.
Os amigos dela ficaram espantados com a sua atitude, mas ela tinha uma resposta pronta: “O perdão foi o maior presente que dei a mim e aos meus filhos”. Agora ela trabalha como mediadora num programa para vítimas de crimes violentos e diz: “Foi uma incrível jornada de cura que salvou a minha vida”.
Para nós, seguidores de Cristo, ou de qualquer outra religião que prega o perdão, não precisamos de nenhum estudo em Stanford e, muito menos, de resultados de pesquisas para saber que o perdão é a maior prova de amor e o maior bem para nós mesmos. Mas é bom ver os pesquisadores voltados para esse tipo de estudo. Afinal, muitos precisam de provas científicas para acreditar naquilo que não podem ver.