eu passarinho

Pode até ser que um dia eu aceite essa meia prisão, essa meia vida. Mas o que sou hoje não cabe em gaiola. Quer voar. Quer descobrir-se. E se cada um sabe de si, sei de mim que hoje não posso mais. Que hoje vou ficar aqui fora, pendurada nesse galho e quase sendo derrubada pelo vento que bate e pela chuva que cai, mas vou ficar. Dentro dessa gaiola nunca vi passarinho abrir voo. E o passarinho que existe em mim quer é voar. Perdão, se o meu canto desafinado cantou tanto pra ti que o fez se sentir dono. Agradeço pelo afago. Pelas acolhidas com direito a beijinho na ponta do bico. Mas é que hoje não suporto ficar e manter os pés tão abaixo do chão. Não suporto essa espera absurda pra vez ou outra ganhar migalha do bico teu. Clarice já avisou que amar não é só ter carinho. Que não é fácil. Eu aviso que não é tão complicado. O complicado é contentar-se. Contentar-se com tão pouco quando se fala de tão muito. E eu não me contento. É por isso que dessa vez quando o sol aparecer, cedinho, me chamando, eu vou.