Venus As a Boy
Rua escura, pedras frias, casa complicada de enxergar - penumbra da noite estrelada sem Lua, sem Lar, sem sujeitos a espera da renúncia perfeita, na perdida casa da noite fria. Casa complicada, eu já havia dito o quanto era? Não havia dito, nem iria dizer, apenas sentia a existência dos poréns infinitos, da falta de coesão simplória que eu havia aprendido com a maldita professora de matemática da oitava série, sétimo ano, do colégio que não tinha futuro.
Um garoto, chamado Vênus, sorria lá do alto deixando-me constrangida e relembrando as lembranças da infância passada, quando minha mãe dizia que eu havia vindo de lá. Mulheres de Vênus, homens de Marte - então porque cargas d'água aquele garoto chamava-se Vênus? Naquela rua da casa perdida nada sabia ser explicado, apenas eu e aquele menino contraditório tentando encontrar-me entre os escombros da terra partida, apenas nós, naqueles centímetros calculados que não nos permitia o toque.
Eu observei então aquelas estrelas com nomes soletrados e complicados, nada demais, nada de menos. Algumas completavam as outras, desenhos complicados, desenhos uniformes e eu ali com roupas de dormir. Por algum motivo lembrei então da professora da dependência de inglês - eu odiava a matéria mas a amava. Ela sempre me fazia pensar nas estrelas e as estrelas me faziam pensar naqueles olhos violetas, como se fosse num transe santo.
E como bailarina adormeci sob as árvores caídas, com suas folhas escaldantes cobrindo minhas sapatilhas coloridas de terra e barro. Vênus me observava, cuidava de longe, aborrecido por não tocar minhas pálpebras cansadas. Minha visão fraca, hipermetrope, dissipava as formas ruins e as transformava em sonhos bons. Adormeci então na rua escura, com pedras frias e também complicadas.