A invenção do céu
Quando olhei a cena tão nítida, brilhante e alvíssima, pensei ser um comercial de sabão em pó. Observando melhor, era uma paisagem que também tinha um belo azul do céu. Ah, logo pensei, é um show do Roberto. Eu me enganei, era o céu mesmo, de verdade, com todas as portas abertas. Isto é só uma força de expressão, pois não tinha porta alguma. Havia um casal conversando e sorrindo brandamente, como convém aos salvos do condomínio da Paz. Não moravam outros naquele lugar que também lembrava o cenário que se imagina do Olimpo. Pensando melhor, o Olimpo era mais animado.
Quando prestei atenção no diálogo do casal, fiquei sem saber se deveria entristecer ou se me alegraria com aquela invenção de céu, ou de vestíbulo de céu. Até me recordei de um texto que descreve aquela mesma paisagem, só que na do texto havia algo sistematizado, uma espécie de cidade, de polis. Também nisto se assemelhava às ideias da Grécia antiga porque a moderna está meio bamba.
Também fiquei sabendo, pelo diálogo entre os dois personagens proprietários daquele pálido ambiente, que, de lá, daquela espécie de observatório, eles avistam o que acontece por estas nossas bandas, e nem precisam de notebooks, tablets e outros trecos que existem por aqui. Vi ainda que existe gente de verdade, de carne e osso, que sonha e, durante o sonho, visita aquelas paragens, mas nunca deseja ficar, apesar da brisa agradável, da falta de poluição e de trânsito infernal.
De repente a câmera muda o foco, mas a cena ficou na memória. E a mente seguia girando em busca de raciocínio que pudesse explicar como pode o céu ser aquilo tão somente branco e azul, sem outras cores para variar, pois aqui na terra tem muito verde, vermelho, rosa, amarelo. O sol é dourado, a lua é entre prateada e dourada. O mar então nem se fala de tanta mudança de cor. Quanta poesia na natureza. Fiquei sem entender porque então seríamos condenados àquela paisagem quase morta. Não vi um passarinho, a música quase não se ouvia, era um lamento longínquo e prolongado. Também não havia polêmica, discussão, debate. Tudo tão calmo e com cara de ponto final.
Não seria melhor que desistíssemos de inventar aquilo para o que não temos ciência e nem competência? Só se sabe exatamente como é uma rua, uma cidade, um país, quando se chega por lá. E esse saber é muito relativo. Ainda bem que foi em uma novela, isto é, não passa de ficção.