Onde está o 1?

-Onde está o 1?

Vera olhou-me perplexa quase sem entender o que eu, na maior calma lhe perguntava. Nunca alguém tivera a petulância de lhe fazer tal questionamento. Era supervisora do estágio de Psicologia do qual eu estava participando. Quase ninguém escolhia fazer estágio nas escolas de Rio Grande porque Vera era a única supervisora, mas eu morava naquela cidade e achei muito complicado fazer meu estágio na cidade vizinha, Pelotas, onde cursara Psicologia com muita dificuldade justamente por morar tão longe. Vera era considerada excelente profissional, pós-graduada, doutorada e media todos os alunos por si, não deixando escapar nenhuma oportunidade de descontar nota do estagiário que se atrevesse estar sob sua supervisão. Era o terror das estagiarias. Raramente alguém tirava nota nove e muito facilmente muitos eram reprovados.

Por isso mesmo dediquei-me o máximo naquele bimestre.

Estava em pé, de frente com a Vera olhando-a firme nos olhos, com meu relatório onde constava minha nota naquele bimestre: Nove.

Passado o momento de surpresa, ela perguntou:

-Recebestes nove e ainda estás reclamando?

Ao que respondi:

-Não. Pra ser sincera, nunca fui aluna nove, durante todo o curso sempre alcancei a nota sete. Mas, agora trata-se do meu futuro profissional. No próximo bimestre vou trabalhar em cima dos meus erros deste bimestre. Portanto, onde está o 1? Onde errei?

Silêncio. Então, depois de longos segundos, ela discorreu que durante o bimestre alguns relatórios estavam incompletos e argumentou sobre outros pré-requisitos que na sua concepção faltara no meu trabalho.

No próximo bimestre recebi minha nota: Dez!

Eu mereci. Claro que mereci. Mas, minha irmã afirma que Vera teve medo de justificar uma possível nova pergunta: "Onde está o 1?".