Não há sertão esperança
Mais de quatrocentos municípios do nordeste estão vivendo as agruras da seca. Vivendo a terrificante miséria no país da abundância. O noticiário vulgariza o tema como se não fosse emergência crucial. O povo do sertão ainda espera a solução vinda do céu através da chuva que não cai.
É rigorosamente trágico verificar o descaso humano da política informativa nacional para com os problemas internos da nação, pois o sertão só ocorre drástico, sem socorro. A informação que nos chega sobre o tema é fugaz através da televisão (não há sertão esperança agora), e mesmo a imprensa escrita parece lidar com este acontecimento como se fosse um evento típico e passageiro. A fome vai roendo aos poucos, gotejando e minguando tudo; até a morte num soluço sombrio, lúgubre, sem ternura, sem poder algum. O que temos é a ideia de algo costumeiro na sobra de sua sina. É a dor por quem os sinos não dobram antes e as orações não doam depois.
Importa mesmo é o navio no mediterrâneo custando fortunas para intermediar os problemas do Oriente Médio nesse elevado custo do Brasil distante do Brasil. Reflexo ufanista da nação gigantesca sem lugar para o país humilde e grande. Brasil faustoso, fabuloso que devia ceder lugar à melhoria de seu povo antes de sediar eventos internacionais babilônicos. Humanismo cínico: que esperar de um pai que não dá aos seus o pão da ceia vital distribuindo aos demais?
O noticiário avisa sobre a seca e a informação comum a tantas outras parece nada, quando os demais fatos se destacam com ênfase. Em momento algum ocorrem passeatas para minorar as condições de vida do sertão. Sertão virou estigma de destino certo, pois só acontece na mídia brasileira quando está padecendo. Breve notícia de lucro informativo perdendo espaço para acidentes de trânsito, boêmios usando drogas, excesso de gordura na alimentação. A notícia do sertão sangrando, calado na aurora noturna, preparando outra noite faminta e sedenta; parece enfraquecer novelas, espetáculos, até a jogatina fluente da promessa individual de riqueza e poder sempre à venda.
Sei que minha voz humilde será enfraquecida pela modéstia da divulgação de que me valho. É voz distante deste cenário doloroso que nunca visitei, nem conheci, apesar de ter nascido em Natal, Rio Grande do Norte. Quisera que esta crônica fosse um grito de solidariedade real destinada a esta gente maravilhosa consumida pela desventura de sol inclemente e descaso.
Deste extremo sul brasileiro rogo ao mundo que envie recursos ao nordeste brasileiro. Para minorar tanta adversidade, tanto humilhante infortúnio. O sertão é a presença de famintos diante do banquete da assoberbada economia nacional. Banquete dos impostos elevados e muito bem arrecadados. Banquete da mídia colossal que pouco se comove para ser técnico e prático. Pobre sertão abandonado entre entranhas de turismo. Minha comoção é verdadeira meteorologia sonhando teu afeto.
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