Fracasso
Tarde de sábado caminho pelas ruas de minha cidade. Cidade de interior, já maculada pelo progresso, pois no caminho cruzo com certos jovens mal encarados que falam em um linguajar marginalizado. Como bom letrista sei que tenho de respeitar as variantes linguísticas e suas facetas socioculturais mas, sendo humano, demasiado humano talvez, desprezo esse dialeto marginal. Continuo meus passos, sem rumo, sem ter no que pensar, em busca de um nirvana inalcançável.
Todos os caminhos levam a Roma, e a Roma de meus passos tomou forma no frontispício de minha faculdade. Sorrio. Tudo é memória, dizia Nelson Rodrigues, lembro-me então dos tempos de faculdade. Ho! Maldito lugar! Imbuiu-me n´alma a ideia de que eu era um talento. Fizeram me crer em uma capacidade que com os anos de labuta foi soterrada. Como professor sou uma miséria, um lixo, um aborto pedagógico seria a melhor metáfora para minhas aulas. Trabalho incansavelmente, prostituo minha capacidade em escolas que me tem como um mal professor. Seria tudo uma questão de posicionamento? Estou eu no lugar errado? Ou possivelmente no mundo errado!
Mas o fracasso que sinto, poderia ter ser charme: “trabalho em escola, mas sou escritor, perdi minha pena nem sei qual foi o mês”. O fracasso faz parte da vida de um escritor, pelo menos é isso que o imaginário coletivo nos força a crer. Lembremo-nos dos escritores que aparecem nas películas de cinema. Sempre sem dinheiro, moram em casas pobres, sozinhos, recebendo a visita de mulheres lindas e cultas que são apaixonadas por seu talento e se compadecem do decadentismo de alguém tão talentoso. Eis o que digo: o fracasso dos escritores de cinema é o sonho daqueles decadentes escritores que vivem a vida como ela é. No cinema as casas são pobres, mas descoladas, cheia de estantes lindas, uma decoração que transpira intelecto obrigatoriamente faz parte do cenário. Lembro de minha casa, sem estilo algum, com paredes a rebocar. Olho para mim e não vejo um talentoso escritor vestido com roupas indie, de camiseta branca e camisa por cima, olho em volta e não vejo a beleza arquitetônica de grandes cidades. O que vejo é um homem de chinelo havainas, short largo e camisa manchada de quiboa. O decadentismo charmoso fica para o cinema, na vida real nós, os aspirantes a escrita, nada mais somos que reles medíocres fracassados.