A quantos decibéis andamos?

Ouvir o canto dos pássaros, do vento, da água da chuva no telhado ou a descer no riacho, é um privilégio nos dias de hoje. O som do cotidiano, totalmente adverso aos sons da Natureza, é quase ensurdecedor. A sonoridade urbana é algo impressionante em nossos dias...

Por alguns instantes tento uma experiência de discriminação auditiva sobre os sons à minha volta. O som da TV, não muito alto, me permite discriminar o ronco dos automóveis, das motocicletas, de suas buzinas e, misturado a rumores de passos, ouço vozes na rua. Ainda durante o exercício, o despertar do celular me desconcentra da música que ouço no fone de ouvidos, acompanhada do pequeno ruído no teclado do notebook... Nesse breve parêntese, de um quase silêncio, me permito experienciar no final de um barulhento dia da rotina urbana, para refletir sobre...

A cidade não dorme. As pessoas não tem privacidade auditiva. Há uma invasão sonora que sem parcimônia, vai tomando conta dos ouvidos humanos, independente do querer ou não. Quase sem escolha. A sonoridade é apelativa e, disfarçada de modernidade, avança indiscriminadamente, sobre as diferentes faixas etárias. Agregando-se com uma rapidez avassaladora aos hábitos do cotidiano e, desprovida de qualquer reflexão anterior a sua incorporação, a sonoridade moderna naturaliza-se nos costumes sociais.

As crianças desde o ventre materno, nos mais diversos tempos e espaços, sem poder de escolha, também são vítimas dessa precoce estimulação sonora. Chama-me a atenção os brinquedos infantis. Se, num passado recente, um pequenino chocalho tratava-se de um excelente objeto de estimulação infantil, hoje desde a chupeta, sem exagero, se não todos, a grande maioria dos objetos infantis são sonoros. Observando os presentes de aniversário de uma pequena de dois aninhos, impressiona a quantidade de objetos sonoros. Seguindo a lógica até a idade adulta, quanto maior a idade, maior o número de aparelhos eletrônicos e, por conseguinte quanto mais sofisticados, maiores recursos acústicos apresentam. Inclusive, a chamada Terceira Idade, também conectada à sociedade do barulho, não consegue ficar em casa sem estar ao menos, com o áudio da TV alto e bom som...

Enquanto isso, em meio à barulheira da cidade, geme a alma em busca de silêncio interior. O que leva o ser humano a perder a capacidade de ouvir a si mesmo? Por que já não há tempo, quiçá espaço para dar ouvidos à música que insiste tocar em seu interior? Quais interesses estão em jogo numa sociedade barulhenta que não ouve a si mesma, tampouco importa-se com a exacerbada violência urbana e o contigente de adoecidos, depressivos e estressados em meio a desenfredada loucura sonora da sociedade pósmoderna?

Quando o silêncio canta, a alma descansa, sonha, pensa... torna-se sábia, capaz de avançar sobre si mesma e, transcender às hiprocrisias impostas. O barulho em demasia, no entanto, tem um fim que justifica seus meios, além de alienar ouvidos e mentes, impõe sua lógica: comprar, consumir, competir, desumanizar, ensurdecer, domesticar, individualizar, etc...

Utilidade pública: Sons intensos, agudos e volumes muito altos podem causar problemas de audição, principalmente quando estão em fones de ouvidos.

Gelci Agne
Enviado por Gelci Agne em 05/05/2012
Reeditado em 07/05/2012
Código do texto: T3650786
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