Tamburello: a carrasca dos brasileiros

“Eu sou feliz. Serei plenamente feliz, talvez, se chegar com sabedoria aos 60 anos. De qualquer forma, ainda tenho muita vida pela frente”. Ayrton Senna, assim como todos os brasileiros, não poderia prever que sua vida, marcada por vitórias e um orgulho nacional jamais sentido novamente, seria interrompida tão cedo. Os braços, que carregaram os sonhos e alegrias de toda uma nação, não conseguiram vencer a curva Tamburello, no Autódromo Enzo e Dino Ferrari, em Ímola, durante o Grande Prêmio de San Marino de 1994. Do Oiapoque ao Chuí, o herói brasileiro deixou milhões de órfãos espalhados pelo país naquela manhã de 1º de maio, todos unidos por um sentimento inconsolável de perda e tentando negar, até o último momento, que o tema da vitória já não embalaria as históricas conquistas de um dos maiores nomes – senão o maior – do esporte brasileiro.

O paulista que voava baixo e que adorava competir em dias de chuva foi três vezes campeão mundial, em 1988, 1990 e 1991. Quem nasceu nos anos 90, certamente, lamenta o fato de não ter conseguido acompanhar a trajetória de conquistas de Senna, que fazia o país parar em frente à televisão, não importando o horário, para torcer por mais uma vitória verde e amarela. Protagonista da melhor volta da história da fórmula 1, o piloto não precisava do melhor carro ou do motor mais potente. Com ele, não existia tempo ruim ou pista sem pontos de ultrapassagem. Tudo isso, porque Senna possuía uma característica marcante e decisiva: competência.

Contar à mãe gentil que ela havia perdido seu filho adorado não foi uma tarefa fácil. Os jornalistas que o digam. As palavras de Roberto Cabrini, no Plantão da Globo, após a confirmação da morte de Ayrton Senna, demonstram isso: “Morreu Ayrton Senna da Silva… Uma notícia que a gente nunca gostaria de dar”. A comoção tomou conta do país e o governo brasileiro declarou três dias de luto oficial. Mas o que leva mais de um milhão de pessoas às ruas para ver e prestar as últimas homenagens a um ídolo – isso sem contar os milhões que acompanharam o funeral pela televisão – que sequer praticava o esporte mais popular do Brasil? O que faz um país inteiro chorar a morte de alguém que a maioria conhecia apenas pela televisão, sem nunca ter trocado uma palavra que fosse e, ainda assim, nutrir um sentimento de afeto tão intenso? Senna foi único, insubstituível; fez o hino nacional brasileiro ecoar nas pistas por onde passou e levou o Brasil a transpirar emoção em cada curva: não existiu ninguém como ele antes – nem depois.

Até hoje, as imagens e vídeos de suas corridas emocionam o público. O tema da vitória é capaz de arrepiar até mesmo quem não compartilhou, em tempo real, os grandes feitos do piloto. Dono de uma habilidade jamais vista nas pistas, Ayrton Senna conquistou o respeito e admiração ao redor do mundo, levando em cada curva e em cada ultrapassagem milhões de corações brasileiros que, acompanhando o ritmo do motor, aceleravam rumo a mais um lugar no podium. A imagem de seus olhos marejados durante a execução do hino nacional brasileiro carregava o amor por um pedaço de terra, estampado nas cores da bandeira que o acompanhava no carro e saudava a nação verde a amarela após a vitória. Tem como esquecer os duelos com Nigel Mansell? Ou, então, a rivalidade com Alain Prost, seu companheiro de equipe na McLaren no final dos anos 80? Não, não tem, nem mesmo por aqueles que precisaram ser lembrados que esses momentos – eternos na história do esporte mundial – existiram.

Mesmo depois de sua morte, o piloto brasileiro continuou nos orgulhando. Ainda em 1994, a família de Senna criou o Instituto Ayrton Senna, para ajudar as crianças pobres brasileiras. A ONG é a concretização de um dos sonhos do tricampeão: diminuir as desigualdades sociais. Desde sua criação, o Instituto vem atuando em prol da qualificação do ensino público oferecido às crianças e aos jovens. De acordo com o Wikipedia, a cada ano, o Instituto Ayrton Senna beneficia cerca de 2 milhões de alunos de 1.300 municípios em 25 estados. Uma prova de que, esteja onde estiver, um verdadeiro heroi nunca morre: apenas parte cedo, assim como todos os bons – bons demais para esse mundo injusto.

Dani Freitas
Enviado por Dani Freitas em 01/05/2012
Código do texto: T3643717
Copyright © 2012. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.