Os poetas e a literatura










 
                                               Algo que me preocupa muito é ver decisões cruciais, que envolvem muito sofrimento e  dor, que dizem respeito, enfim, à vida de todos nós, nas mãos  de pessoas que conhecem muito pouco  da  vida.
                                               Um técnico do Direito, por exemplo, que praticamente conhece de cor e salteado  as teorias e códigos de sua área profissional, as filigranas jurídicas, divorciadas da vida real, sem a vida das esquinas da rua, dificilmente entenderá o que está por trás da convivência humana, sempre turbulenta, com as inevitáveis quedas no vácuo da ignorância ou da má interpretação. Julgam, na grande maioria das vezes, com seus defeitos, suas idiossincrasias e não com a lucidez tão necessária para dirimir um conflito humano.
                                               Todo esse preâmbulo é para dizer que aqueles que estão com a missão de julgar têm que ter,  antes de tudo, muita vivência, precisam conhecer a alma do homem, mesmo que empiricamente, senão, suas decisões farão mais   mal do que bem. É trágico saber que isso acontece o tempo todo nas nossas vidas. Como estamos longe da maturidade mental, tanto individualmente,  como nos níveis governamentais, pergunto: qual o governo do mundo, na atualidade,  que pode ser apontado como grande exemplo. Digo grande exemplo, porque o leitor, naturalmente, se lembrará de alguns poucos governos com algum progresso  moral, mas isso porque  comparado à maioria dos Estados, nada  exemplares, a começar por seus governantes.
                                               E agora passo a dar o meu modesto recado, numa simples crônica, portanto mergulhando raso, mas que pode nos  dar uma boa reflexão.
Houve na semana que passou uma decisão polêmica no nossa Corte   
Suprema . Não vou entrar no mérito da questão, altamente explosiva. Quere apenas mostrar a sensibilidade de um Juiz que, em certo momento do seu voto, disse o que estou ocultando ao leitor até agora. Em outras palavras, decretou que   o  Julgador para bem  julgar precisa ler mais os poetas. Em suma, penso eu, além da vivência, claro, necessita  alimentar-se de  literatura.
                                               Todos os grandes da vida sempre afirmaram que aprenderam mais com a literatura, pois a obras imaginativas, principalmente o teatro e a própria novela, afetam muito  mais as pessoas  que um pobre código moral.                  
                                            O humanista do século passado, Henri Peyre, afirmava que essas obras são um veículo mais poderoso do que os  ensinamentos morais, sendo um estímulo mais eficaz à reflexão ética. São dele essas palavras: “O homem de letras que há nele sobreviverá talvez ao filósofo; seus contos e peças afetaram um número incontavelmente superior de pessoas e agiram sobre a sensibilidade e a vida interior delas de um modo mais duradouro do que seus volumosos ensaios filosóficos.
                                               Como tudo na vida, meu bom e compreensivo leitor, há que separar o joio do trigo. E tudo teremos  que aprender, duramente.  Não nascemos com o “manual do proprietário”.
                                               Há obras literárias que contaminam, assim como há cidades que não curam.  Manaus, por exemplo, onde só fiz nascer, pois saí de lá com apenas dois anos, soube que é uma cidade que não "cura", ao contrário das cidades mineiras onde existem as famosas águas minerais.  Segundo conhecido romancista  amazonense, Milton Hatoum, as pessoas vão à Manaus não para se curarem, mas para se contaminarem... Por destino, fui criado no Rio de Janeiro, outra cidade que contamina...
                                               As grandes obras, já disse alguém, poderemos saber pelo seguinte sinal: todas elas retratam o lado negro da vida, não fogem de relatar o pior. Mas todas elas apontam para um futuro otimista.
 



                       Nota:  Mais uma crônica antiga, que foi pouco lida quando publicada.
                                  Republico, com algumas alterações. Gdantas