Culpa

Hoje faz frio, muito frio. Talvez por isso algumas lembranças batam nas portas buscando um abrigo. Não que eu as quisesse, são dolorosas, têm os semblantes carregados e áusteros e causam-me arrepios. Mas, por mais que eu fuja, olham-me pelas janelas e gemem.

Pois bem, melhor deixar que entrem e digam a que vieram.

Acomodadas pelos cantos, reconheço uma a uma e tenho certeza que outras se acharem espaço ainda tentarão se esgueirar pelas frestas de minha mente. Como se fosse possível para elas, as lembranças, meus olhos se debruçarem sobre as valas escuras que tento em vão cobrir, sem me ferir...

Essas, as de hoje, quase tocáveis, me fazem recordar de todas aquelas madrugadas geladas em que como uma zumbi seguia meu caminho cheia de culpa ao visitá-lo.

Trazem-me o percurso percorrido, a rodoviaria gelada, a fila dos taxis e sempre o mesmo destino: Um hospital psiquiátrico.

Pode ser que pela medicação, não sei, ele pouco lembre-se desse periodo. Há fatos que alega desconhecer mesmo quando os relato.

Mas eu não. Em mim ficaram cravados todos os dias, todas as horas, todas as noites.

Talvez por sentir essa culpa tão imensa por esse passado, meu e dele, esteja hoje no mesmo ponto em que estava lá atrás, talvez por isso o frio me faça retornar à mesma encruzilhada desejando novamente seguir um caminho oposto ao que tenho de seguir. E ela, a culpa, sentiu-se no direito e no dever de aliciar lembranças amargas como um remédio para meus desejos e devaneios.

A culpa, sempre a culpa...

Almma
Enviado por Almma em 30/04/2012
Código do texto: T3642066
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