Ainda há luz em Salvador
Ainda há luz em Salvador
Jorge Linhaça
Nem tudo esta perdido na Cidade da Bahia de todos os santos.
Hoje fomos ver a apresentação da NEOJIBA, (Orquestra Sinfônica Juvenil da Bahia) na Catedral Basílica e para minha surpresa, na terra do axé, do pagode baiano, do arrocha, atocha, e outros lixos musicais, que se propõem a não mais do que propagar a devassidão e a falta de valores morais em suas letras, incitando a “pegação” e o sexo fácil com suas “coreografias” obscenas, mais de 300 pessoas compareceram ao evento para apreciar Mozart.
Infelizmente, de maneira inversa à composição étnica do povo soteropolitano, menos de duas dezenas dos espectadores era composta por afrodescendentes. Na orquestra em si parece que a proporção se mantinha no mesmo patamar da plateia.
Do lado de fora da Basílica, um grupo tocava pagode e concorria com a orquestra, desnecessário dizer que o público era inversamente proporcional ao da orquestra.
Claro que a preferência musical é uma coisa subjetiva e não espero que em nenhum lugar do Brasil a música clássica atraia mais público do que a popular, isso seria estupidez da minha parte.
A questão é perceber como existe uma manipulação musical na primeira capital tupiniquim. Numa cidade onde predominam os afrodescendentes era de se esperar, ao menos, certo equilíbrio étnico na plateia erudita. Infelizmente isso não parece ocorrer.
Essa visão estereotipada de que negro só gosta de ouvir tambor parece ter se enraizado de maneira tal em solo baiano que, os próprios afrodescendentes tenham vergonha de preferir outros gêneros musicais além dos atribuídos às raízes africanas.
Não que os ritmos derivados da africanidade tenham algo de errado, gosto de samba, de jazz, de blues, spirituals e outras tendências musicais. A questão é essa ideia da predisposição à má musica e às letras sem conteúdo algum.
Para mim existem apenas dois tipos de música:
A boa e a ruim.
A boa leva à reflexão; eleva a alma, nos faz viajar entre a dor e a alegria, conforme as letras e a melodia;
Já a má, não nos acrescenta nada, nos rebaixa aos instintos animalescos do ser humano com melodias e refrões fáceis de decorar e exaustivamente repetidos como palavras de ordem.
Sintomaticamente são estas últimas que caem no gosto mais popular, que se “grudam” nos ouvidos e nas mentes das pessoas e fazem parecer que a permissividade de tais letras deve representar o comportamento da população em geral.
Não é, pois de se estranhar que a permissividade moral caminhe a passos largos e infeste as mentes de nossa juventude.
A indústria pornô-fonográfica lucra horrores com esse tipo de “música”, os pseudo-artistas fazem o seu pé de meia, enquanto a sociedade como um todo sofre todos os prejuízos advindos dessa prática.
A mídia, sequiosa pela sua parte no jabá, corre a reproduzir tais musiquetas e dar notoriedade aos seus interpretes nos programas populares e de massa, amplificando o descalabro musical em busca de alguns pontinhos a mais no ibope.
Claro que isso não ocorre apenas na Bahia ou em Salvador, mas aqui parece ser um celeiro infindável do mau gosto musical.
Aqui, a cada dia surge uma nova “música” de duplo sentido ou explicitamente depreciativa da mulher, dia destes ouvi uma que dizia algo do tipo: ”Mariana...já peguei...Julieta, já comi...Fabiana , já peguei...a Lucinha, já comi”...e por ai ia a letra citando nomes e mais nomes de mulheres acompanhados pelo coro de já peguei, já comi...em resumo, nada além de pura apelação.
O pior é ver que a mulherada vai ao delírio com esse tipo de letra; Sentem-se as próprias pegadas e comidas.
Adoram ser chamadas de “periguetes”, como se isso houvesse se tornado, da noite para o dia um elogio. Esquecem que “periguete” é um neologismo para “ mulher à perigo”, ou seja, disposta a fazer sexo com quer que seja.
Antigamente dizer “-lá vem a periguete” significava, “segurem seus maridos.”
Mas felizmente ainda bruxuleia a luz em Salvador, enquanto houver um mínimo de pessoas que gostem de boa música, nem tudo estará perdido na cidade do tudo vale e tudo pode.
Salvador, 28/04/12.