As coisas que penso quando pareço normal
Quando não tenho nada pra dizer eu sonho. Invento lugares. Crio palavras. Conjugo verbos. Dedilho sentimentos. Fantasio finais para inúmeras viagens que ainda nem fiz. Brinco com meu cabelo - me descabelo. Passo infinitos minutos deitada, olhando pela janela, através dela, colando e colorindo fotografias nas nuvens. Me caso. Tenho filhos. Não me caso. Moro sozinha. Como pastel engordurado. Lambo os dedos. Durmo tarde. Me embebedo de vinho tinto. Faço lanches para compensar refeições. Forço a memória pra lembrar todos os rostos da semana que passou. Penso nas vezes que chorei, nas que exagerei um sorriso. Penso em olhares diversos. E em mudar de opinião sobre mais alguns assuntos. Não penso em nada! Conto quantas vezes pisquei os olhos enquanto o galho do pé de acerola não se mexia. Desenho o mar no céu. Imagino que o mar seja o céu e que o céu seja o mar, que tudo está de cabeça pra baixo. Fico de cabeça pra baixo. Planto bananeira. Começo a esboçar um sorriso. Rio alto. Mais alto. Estou às gargalhadas. Por dentro. Um rosto normal ainda observa tudo. Planejo frases como oração. Cochilo e nem percebo. Aí eu sonho mesmo. Acordo. Continuo em silêncio.