DONA  ISABEL.


           Era uma viúva, dona de umas terras, as   quais arrendava para os pequenos plantadores. Era elegante para os padrões da época, com os cabelos presos num coque e  brincos de ouro pendurados na orelha.  Tinha um filho único chamado Lourival, se não me engano. Corria o boato de que ela tinha um ciúme louco do filho e não deixava nenhuma  moça do lugar, por  os olhos nele. Naquele tempo eu ainda era menina, nem cheguei a conhecer o tal mancebo.  Dona Isabel tinha um apelido,  Velha Caroara. Em Santa Catarina, segundo o meu marido, caroara é a pessoa que gosta de fazer intrigas, fofoqueira, que fala mal de todo mundo. Alem disso corria  outro boato, de que Dona Isabel virava matinta  pereira nas noites  de lua cheia,  às  sextas feiras.  Uma bela tarde de verão, dessas em que o sol fica à pino, eu e minhas irmãs estávamos empoleiradas em cima de uma árvore, bem perto do caminho ou estrada por onde se transitava naquele tempo. De repente divisamos    Dona Isabel, sempre com sua sombrinha protetora. Ela caminhava com passo miudinho, parecia  uma põe- mesa, de tão empertigada que era.E então, resolvemos azucrinar  a pobre mulher e gritamos em coro: Velha Caroara, matinta pereira do Igarapé Açu de Cima!  Dona Isabel proferiu todo o estoque de palavrões  do seu arquivo.E nós, é claro com toda a falta de educação, caímos  na risada. Essas eram transgressões  que  cometíamos  naquele tempo e que  se nossa mãe descobrisse, vara de marmelo nas canelas. E foi o que aconteceu, pois dona Isabel não se fez de rogada e foi  contar a nossa travessura para minha mãe  e aí, pagamos pela nossa falta de respeito para com os mais velhos. Dona Isabel compõe a minha galeria dos   meus tipos inesquecíveis.


Obs: a matinta pereira era um pássaro noturno  com um assobio apavorante, mas naquele tempo dizia-se que era uma sina  dada como castigo a uma pessoa.  Igarapé Açu de Cima é o povoado onde eu nasci.