O futuro da Nação
Ou me engano ou tenho memória curta. Parece-me que em anos passados havia menos pedintes em nossas ruas. Hoje encontramo-los por todo o lado. Nos anos 1980, fiz um curso de especialização em país latino-americano ao norte do Brasil. Impressionou-me o número de mendigos. Pensei: “No Brasil não se vê isso”. Hoje, não me arrisco a dizer o mesmo. E todos os indicadores apontam que nosso País melhorou ultimamente.
Uma das causas é, sem dúvida, a desgraça das drogas, que domina parcela considerável da população. Hoje, ela não se restringe às grande cidades. Invadiu todos os espaços. Naquele curso ouvi falar de “drogadictos”, mas não tinha ainda noção exata da calamidade escondida por trás dessa palavra. Em poucos anos assolou-nos uma tragédia que reduz pessoas a farrapos, sem perspectiva de dignidade nem de futuro. Em Maringá, a Igreja Católica oferece pelo menos quatro instituições, mas nem de longe sonha em resolver o problema. Os voluntários do MAREV, do Projeto Plantando Vidas, do Recanto Mundo Jovem e da Casa de Nazaré sabem que apenas despejam uma gota d’água num deserto de miséria. É a contribuição católica para nossa comunidade ferida por uma chaga que parece não ter fim.
Não tenho como saber se aquele que me pede ajuda é um viciado ou não. Ainda que fosse, que sei eu da vida dele ou dos motivos que o levaram a esse ponto? Acho válida a campanha de não dar esmolas. Auxílio isolado, não mais que uma migalha frente à multidão de necessidades do infeliz, não vai resolver coisa alguma. Quando muito, atenderá bastante mal a alguma carência de momento. Pela insignificância do valor, na maioria das vezes, servirá apenas para afundá-lo ainda mais no vício da droga, da bebida ou da mendicância.
Movidos pelo sentimento de natural piedade, acabamos dando esmola, mesmo sabendo que nada resolve. Defendemo-nos com a desculpa de que fizemos nossa parte; o uso que lhe é dado já não é responsabilidade nossa. O problema, infelizmente, transcende palpites imediatistas e ações improvisadas.
Por mais que a sociologia desfile argumentos, o nosso emocional se impõe e supera a razão. Dia desses, na rua, aproximou-se um rapaz propondo: “Padre, estou com fome. Eu nem preciso pôr a mão no seu dinheiro. O senhor mesmo compra alguma coisa para eu comer”. Falava caminhando ao meu lado, enquanto eu lhe fazia um sinal negativo com a mão. Depois de algum tempo, desistiu. Mas quem tem um coração mole como nós, latinos, responda com sinceridade: Ficaria em paz, vendo-o se afastar? Segui-o com os olhos para saber que rumo tomaria. Virou a esquina. Dei volta à quadra, apressado, quase correndo, para não perdê-lo. Tinha que encontrá-lo outra vez. Achei-o na esquina, ajoelhado, revirando um montinho de lixo. Que podia conseguir ali? “Você está mesmo com fome ou está só me engrupindo?”. Pergunta tola a minha. Eu já conhecia a resposta.
Arranca lágrimas ver um rapaz ajoelhado no chão, fitando-nos com dois olhos verdes perdidos num rosto magro e barbudo. Jovem e já um andrajo humano. Dei-lhe uma nota capaz de comprar um lanche. Esta noite ele não precisa dormir com fome. E amanhã?
No Brasil rico, que pode esperar esse moço? A gente se cansa de ouvir que a juventude é o futuro da Nação. Jovens como esse também são esse futuro?