GARDNER E O CARA DA RAY LUQS PRETA
Creio que os conhecimentos de português e de matemática são os mais ensinados pelas escolas, mas evidências me mostram que eles são, também, os menos aprendidos. Isso não teria muita importância, se ao ter lacunas cognitivas nessas disciplinas, as pessoas não corressem riscos de passar vergonha publicamente.
Como professora, sei que o problema é angustiante, sobretudo enquanto o aprendiz está sob a nossa tutela. Exatamente por isso, os docentes, de modo geral, buscam explicações em teorias que possam explicar o fenômeno.
Entre elas está a das Inteligências Múltiplas, de Howard Gardner (1985). Trata-se de um psicólogo construtivista, muito influenciado por Piaget, avesso aos testes de QI. Ele estudou como se deu a evolução cognitiva humana através dos milênios, como ocorre o desenvolvimento de diferentes habilidades em crianças normais e superdotadas, e, também, em adultos com lesões cerebrais e em populações ditas excepcionais.
Gardner diz que as inteligências podem ser classificadas em: linguística, lógico-matemática, espacial, musical, cinestésica, interpessoal e intrapessoal. Essa seria a explicação por que há pessoas que têm facilidades para lidar com línguas e linguagens, para calcular, para se localizar nos espaços, para usar a coordenação motora, para entender e responder adequadamente a humores de outras pessoas, e por fim, para ter acesso aos próprios sentimentos e para lançar mão deles na solução de problemas pessoais.
Dessa forma, para Gardner não existe a burrice absoluta, já que os sujeitos ditos “normais” podem, simplesmente, não ter nascido com alguma dessas inteligências e/ou a escola pode não ter trabalhado adequadamente para desenvolvê-las.
Essa teoria me consola e costumo dela me lembrar, quando estou ensinando, mas queria muito saber desse autor, qual é explicação científica para o caso que relato a seguir.
Tenho uma amiga que, além de ser bonita e um doce de pessoa, é uma psicóloga competente. Como toda profissional de sucesso, ganha o suficiente para se vestir bem e se locomover em um carro decente.
Noite dessas, indo para uma festa, teve dificuldades para estacionar seu veículo, conseguindo uma vaga apenas quando um rapaz bonito e sarado entrou em uma camionete Hilux preta e a retirou do local. Por volta da meia noite, desejando ir para casa, encontrou sobre o para-brisas de seu carro o seguinte bilhete:
“Ô morrena bunita eu sô o carra da Ray Luqs preta. Gostei di voçê. Mi ligá o celulá 9999-9999*. Ass. Carra da Ray Luqs”.
Na manhã seguinte, ela me contou sobre o fato e me mostrou a “prova”. Perguntei-lhe se Freud explicava coisas desse tipo, e juntas rimos muito. Como o pai da psicanálise não sabe por que um sujeito tem coragem de deixar um bilhete cheio de erros de português para alguém; decidi fazer uma perguntinha para o Gardner:
“Howard, amado mestre, qual é mesmo o tipo de inteligência desse rapaz?”
Obs. Naturalmente eu não vou escrever qual é o número real do celular do “Tapadinho”, porque minha inteligência não me permite fazer nada para ganhar um processo por danos morais. Bem.... é claro que eu ainda posso me lascar, se ele for “inteligente” a ponto de se identificar. Rs,rs,rs...