DESCASCANDO BATATAS
Hora de preparar o almoço! Penso no cardápio e sondo a cozinha em busca de ingredientes. Olho qual carne fazer e passo para a escolha dos legumes. Claro que escolho algumas batatas. Não dá para não pensar em fazer algo com batatas. Aliás, elas deveriam ser obrigatórias no cardápio de todos os dias, assim como o arroz e o feijão. Sento para descascá-las e é tão mecânico esse ato que minha mente flutua enquanto meu corpo permanece. Das batatas passo para a lembrança de como a minha vida também precisa ser descascada. Retirar essa proteção que reveste minha alma é definitivamente mais complicado.
Os anos foram atravessando na minha frente sem que eu pudesse entender que não acontecem voltas. Não há retorno. Passou e seguiu adiante. Esse é o tempo que fez com que minhas experiências se solidificassem e recobrissem minha identidade, não apenas para sufocá-la, mas também para protegê-la de uma forma abrupta, sem que eu mesma me desse conta.
Sei que parece uma viagem louca de minha mente mas aqui dentro tudo faz sentido. Um sentido absurdo! Tá na hora de desfrutar dessa batata, desfrutar das minhas experiências, do que aprendi após passar por tantas coisas ao longo desse tempo que atravessou. E sei que só vou conseguir saborear tudo isso após retirar a casca que me constrange, que me impede de seguir adiante. E então observo as batatas nuas em minha frente e decido por prepará-las de forma simples, saborosa. Não deve ser assim a vida?