Melancolia aos 50

Estou no limiar dos 50.

Constato meio assustado,

Chegou mais rápido do que o planejado.

Acho que serei pego meio desarrumado,

Dentes por escovar,

roupa no varal para tirar,

Prestações para pagar,

Desculpas para suplicar,

Amizades para relembrar.

Enfim, impossível não pensar

Que não tenho mais muito tempo a esperar.

Ainda há muitos livros para ler

Uma outra faculdade: música, psicologia,

Não, filosofia, mas eu adoro astronomia,

Quem sabe turismo e passar o resto da vida viajando.

Enfim, necessidade de ainda decidir como um adolescente

Coisas que os outros juram, e eu jurava também,

Que, quem chega aos 50 essas dúvidas mais não têm.

Ah, tem aquele perfil de mulher que a gente

nas fantasias sonhou a vida inteira

Mas nunca realizou, talvez pela religião,

Ou, por princípios, falta de coragem,

Oportunidade, vergonha talvez,

Baixo-estima, ou, simplesmente,

Porque ela estava muito acima

Do que pensávamos poder.

Os 50 fazem-me pensar em abandonar

As lâmpadas fluorescentes, que, agora,

Nem mais assim devem ser,

Eram o que eram quando eu tinha os vinte ou trinta,

Agora sei lá o que devem parecer.

Não tenho cabelos, mas às vezes penso

Em deixar o que restou crescer.

Como sinto inveja quando vejo um cinquentão

Cabeludo, tatuado, mastigando um chiclete

Com um instrumento musical nas costas

E uma bela mulher ao lado,

Ah sim... e de chinelo,

Calça jeans e barba por fazer...

Serão os hippies mais felizes?

Ou seriam todos viciados, que droga!

Não quero ser um hippie,

Mas livre como eles eu poderia parecer.

Vou ao Cine Odeon, no Centro do Rio, acho que vou.

Talvez passar os 50 lá dentro.

Aquele lugar acalentou e alimentou as minhas fantasias

Por tanto tempo. Sugou-me para as suas

poltronas e penumbra dos belos lustres.

E me jogou, à força, nos filmes

Dramáticos nas tardes de sexta-feira.

Eu jurava, quando lá entrava,

Que iria encontrar por perto

O meu grande amor vagando por acaso

Que, por descuido, em mim esbarraria

Deixando a carteira por perto cair.

Para eu apanhá-la e casar... pronto.

Igualzinho acontece nos filmes...

A vida seria uma Ilusão? Uma metáfora.

Lá vou eu, agora, puxar o meu lado filosófico

Da cartola de mágico sem graça e sem sorriso.

Não. Chega. Não quero virar os 50 assim.

Não vou virar os 50 como um menino bobo

Com semblante de gente séria.

Que acha que basta sonhar

Para ser feliz...

Queria passar os 50 pensando...

Talvez em um lugar ermo,

Vendo o Sol brilhar.

As aves marinhas brigarem

Por um peixe no mar.

O mar, caramba, quando penso no mar,

Dá vontade uma escuna roubar,

Ligar o motor a mil

E fugir para o fim do mundo

Até o combustível acabar

Para não ver ninguém

Nem o reflexo dos 50.

Pois as ondas turvas

do mar revolto não deixariam.

Eu estaria só, sozinho no mar.

Sem ter para onde fugir

E nem precisar sorrir,

Pois não teria ninguém

Por perto para simpatia fingir.

Faltam algumas horas para os 50..

Muita coisa pode mudar...

Não, não pode... chega de ilusão...

Acho que vou trancar os olhos..

Colá-los com decalques de diário de adolescente

E dormir, dormir.

Quem sabe eu sonhe...

Ah, sim... descobri como não passar pelos 50...

Basta sonhar! Nos sonhos sempre sou jovem..

E feliz...

Vou dormir, e não ver os 50 chegar!