"Dizendo sim..."
Já ouvi falar, em algum lugar, que fácil na vida é ver as coisas... Nenhum sentido é mais querido em nós humanos quanto a visão. Nos maravilhamos com estórias de pessoas que, sem essa capacidade, conseguem sobrepujar as dificuldades e adaptam-se à nova “visão” de mundo. Mas será que apenas os que não possuem a capacidade de ver, fisiologicamente dito, não veem? Aqui entra a diferença de “ver” e “olhar”.
Dizem que Kublai Khan, neto de Gengis Khan, jogava xadrez com Marco Polo, quando aquele, tomado de grande dúvida quanto a utilidade daquele jogo, perguntou: “O que é a derrota, Marco? O que estou defendendo aqui, não são apenas casas brancas e negras?” Então, de forma conciliatória, Marco Polo começou mostrar-lhe detalhes na madeira utilizada na confecção do tabuleiro: “Não vê que o tronco do qual foi feito esse tabuleiro é de uma árvore que sofreu grandes agruras?” Kublai não entendeu sobre o que falava Polo... Aí, Marco lhe chamou a atenção para os anéis de crescimento da árvore e como eles retratavam as intempéries passadas por aquela planta. Khan pôde perceber que nada está livre de uma segunda vista, um segundo olhar. Tudo ao nosso redor está cheio de detalhes e mostra sua história e seus segredos maravilhosos.
Estamos constantemente cometendo o erro de Khan, apenas vendo as coisas ao nosso redor. Não paramos para olhá-las e compartilhar um pouco de sua história. Esse erro não acontece apenas com coisas, mas principalmente com pessoas...
Não o fazemos intencionalmente, concordo; mas, sem dúvida, isso pode atrapalhar grandes descobertas na já tão efêmera vida humana. São tantos os afazeres e responsabilidades que, simplesmente, podemos dividir o mesmo ambiente com uma pessoa fantástica e não tomarmos conta disso. Mas o bom mesmo é o “acordar” para essa percepção! É como se todo tempo de distração fosse usado para juntar dados, lembranças que ajudam e dão sentido ao olhar finalmente para a pessoa. É como se construíssemos um circuito que em um determinado momento começa a funcionar, liga-se e dizemos: “Voilà! Como não vi antes?!” Será que passamos, então, grande parte do tempo distraídos com as tarefas cotidianas e não olhamos ao redor? Ou também , correndo por fora, há ajustes finos nos olhares e disponibilidades das pessoas? Tal como solos musicais de instrumentos diferentes e, de repente, há um ajuste e o que soava mal e descompassado agora é um dueto? Talvez as duas coisas aconteçam, o erro de Khan e o descompasso musical. Mas é maravilhoso quando olhamos para o lado e vemos a possibilidade de um dueto! Como disse Clarice, a vida começou com um sim, uma molécula disse sim à outra e, assim, a vida começou. Talvez, primeiro uma molécula olhou a outra com desconfiança e dúvida. Depois, veio a pergunta tão urgente e tão disposta a novas descobertas: Por que não? Daí vem toda estória e o circuito começa finalmente a funcionar! Engraçado, ultimamente, a pergunta que não sai da minha cabeça é: Por que não?