Labutar incessante...
Quando criança ‘gastava’ um bom tempo observando o vai-vem das laboriosas formiguinhas que carregavam nas costas, por vezes, material que aos meus olhos pareciam pesar mais do que o seu próprio peso.
Devidamente ordenadas desapareciam nas frestas existentes nas calçadas e reapareciam momentos após repetindo novamente todo o ritual.
Poderia, partindo dos que lêem esta minha inicial narrativa, soar a seguinte indagação:
“Como sabe ele que aquela formiguinha que havia adentrado a fresta foi a mesma que reapareceu momentos depois?”.
Na curiosidade infantil inerente a quase todos os ‘baixinhos (me permita a pop-star XUXA esta apoderação...), depois de alguma meditação espalhei um liquido colorido na cor vermelha em pequena parte do itinerário cumprido pelas marchantes e fiquei observando ‘no retorno’ se alguma apresentava a marca.
Foi assim que constatei que uma célere trabalhadora em poucos minutos estava retornando à sua lida...
Pode parecer precocidade de minha parte, porém, já na época tentava estabelecer algum paralelo com o ser humano.
Inexorável o tempo passou, e já na fase adolescente e rapidamente na fase adulta, houve uma mudança de cenário e, ao invés das laboriosas formiguinhas, minha observação recaiu sobre o vai-vem dos meus semelhantes, em sua grande maioria à caça de uma digna sobrevivência!
De forma comedida aquilatava que não havia uma perfeita sincronia entre, por exemplo, os atos realizados por um ser humano em seu dia a dia não o forçavam carregar em seu dorso um peso que, à vezes, superasse o seu próprio peso corporal. Porém, internamente muitos (senão a grande maioria...) carregam preocupações compostas pelas responsabilidades, insegurança em seus vários aspectos e muitos outros aspectos à sua condição humana e que, embora não materialmente, representam um enorme fardo em suas vidas!
Tive (e ainda tenho...) oportunidade de observar por momentos o vai e vem das pessoas usuárias das composições férreas representativas dos trens metropolitanos e companhia do metrô e posso consigo captar na maioria dos semblantes dos sempre apressados usuários, taciturnidade e aparente mau-humor, fazendo-me deduzir que carregam em seu interior um peso maior do que seu próprio peso, aí em forma imaterial diferentemente da forma material que faziam (e acredito que ainda fazem...) as lépidas formiguinhas!
Daí, ‘ouso’ estabelecer paralelos com algumas composições musicais, poéticas... decantadas em prosa e verso por alguns observadores sensíveis, artistas consagrados ou simples amadores, que abordam o cotidiano, o ‘modus operandi’ dos humanos em sua lida diária.
Creio que todos nós já tivemos oportunidade de ler ou de ouvir letras de canções que cantam o dia a dia da população, como por exemplo, a canção Procissão de autoria de Gilberto Gil, que prega: “Olha lá vai passando a procissão, se arrastando que nem cobra pelo chão, as pessoas que nela vão passando, acreditam nas coisas lá do céu...”.
Ou ainda, a canção VIDA DE GADO, autoria de Zé Ramalho, cujo refrão ‘reza’: “Eh, ôô, vida de gado, povo marcado ê, povo feliz, eh, ôô, vida de gado, povo marcado, ê, povo feliz...”.
Grande mérito de nosso povo, saber conviver com as adversidades...