Bebendo demais
“Cada qual tem o seu álcool. Tenho álcool bastante em existir. Bêbado de me sentir, vagueio e ando certo. Se são horas, recolho-me ao escritório como qualquer outro. Se não são horas, vou até o rio fitar o rio, como qualquer outro. Sou igual. E por detrás de isso, céu meu, conste-lo as escondidas e tenho o meu infinito…” *
Cansei do invólucro. E ando bebendo demais. Mudei o foco. Saio à cata de outros lugares que acrescentem de verdade. E sempre acho que falta algo que nunca sei o que é. Sinto-me sujo de coisas que não fiz, mas que acho que deveria fazer. Ando bebendo demais. Vivo num constante e inútil processo de catarse. O tempo passa e eu ainda por aqui. O tempo passou e talvez eu nunca estive aqui. Estar no lugar errado na hora errada. Chega. É necessária a mudança de recipiente.
“Assim como lavamos o corpo deveríamos lavar o destino, mudar de vida como mudamos de roupa — não para salvar a vida, como comemos e dormimos, mas por aquele respeito alheio por nós mesmos, a que propriamente chamamos asseio.” *
*trechos do Livro do Desassossego, de Bernardo Soares, heterônimo de Fernando Pessoa.