Limponadasensívelaoesvaziar12garrafas.

“Não choro mais. Na verdade, nem sequer entendo porque digo mais, se não estou certo se alguma vez chorei. Acho que sim, um dia. Quando havia dor. Agora só resta uma coisa seca. Dentro, fora. Por vezes fecho os olhos e tenho a impressão de que esses telhados intermináveis são a única coisa que existe dentro de mim, você me entende agora? O quê? Sim, tenho vontade de me jogar pela janela, mas nunca foi possível abrí-la. Não, não sei o que gostaria que você me dissesse. Dorme, quem sabe, ou está tudo bem, ou mesmo esquece, esquece. Não consigo.”

Luz e Sombra – Caio Fernando Abreu.

E os desfiles, modinhas, cabelinhos, roupas, flashes, medo, carteiras vazias. Servem de que? De nada.

O suor e a respiração ofegante, o cabelo, o ombro, o braço e a força incomum inspirada por sei lá o que, sei bem do que se trata. O puxão, o carinho, a ponta do dedo, o lábio e a carne. Perna, abre, encaixa, solução, fricção, se explode junto. Pra se resumir a nada.

Ah sim, cartinhas, fotos, viagens, apelidos, servem de bosta nenhuma.

Mais ou menos um abismo de diferenças e dois ou três pontos em comum. Servem de bastante coisa. Ah e as piadas, mas vai pra lá, luzes, rostos e caretas, gente babaca que toma o seu lugar.

Ah tua blusa listrada, o universo que conspirou a favor e clarões na vista. Quantos clarões. Mas agora já não há espaço pra nada. Nem pro aperto de mão. Vira as costas pra mim, que tu não me valhe nada, porra. Só queria o cheiro, o abraço, a roupa amassada acordando num bom dia cansado e no calor do sol empurrando a janela do quarto dizendo: levanta que não é só isso.

Mas eu acelerei, milhares de vezes excedi os limites do plausível, a gasolina, a correria, eu fui atrás de ti. Eu fui correndo, fui de a pé, mas fui. Agora não serve de nada. Tô na mão, mas é desse jeito. Você segura a onda aí de um jeito e eu de outro, já não existem juras nem palavras nem adiantou falar nada. Dá pra ver nessa hora: mãos separadas, passos longos na rua. A televisão já não presta, nem ela nem seus programas inúteis que parecem tão lindos. Faça-me o favor. Para de se lamentar. Não consigo. Tudo é lamento.

Sensação de: não existe mais o que fazer. Uma calmaria interior, e do lado de fora também. Muitas possibilidades, nenhuma atrai. Nem mesmo a escolhida. O que fazer depois disso? O gosto do álcool soluciona. O sol volta a bater na janela do quarto e o outro dia vem te fazendo levantar, afinal: com tão-poucos-anos-vividos é inadmissível que pereças, ainda mais hoje em dia.

Ainda mais.

Sopro Mato
Enviado por Sopro Mato em 30/03/2012
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