A vitória da esperança sobre a experiência

“Tem uma antiga e maravilhosa piada italiana sobre um homem pobre que ia à igreja todos os dias e rezava diante da estátua de um grande santo, implorando:

- Querido santo, por favor, por favor, por favor, deixa eu ganhar na loteria.

Finalmente a estátua irritada criou vida, olhou para baixo e disse ao pedinte:

- Meu filho, por favor, por favor, por favor, compre um bilhete!”

Este trecho de Comer Rezar Amar sintetiza um dos grandes erros da humanidade: entregar tudo nas mãos do destino. Não que eu não acredite em coisas que são para acontecer, do tipo “se for pra ser, vai ser”, mas a sorte precisa sempre de um empurrãozinho da nossa boa vontade. Toda história é, na verdade, uma moeda com três lados: você não compra o bilhete, você quer ganhar na loteria, mas tem medo que isso aconteça. Medo de não saber o que fazer com aquilo que ganhou, insegurança de gastar o prêmio de forma indevida. Sequer precisamos de um jogo de aposta para chegar a essa conclusão: a insegurança anda lado a lado com a vontade de ser feliz. É como ter a vontade de comer chocolate, mas ficar com medo de engordar. Um eterno paradoxo que só é quebrado quando o resultado do jogo não for mais importante que a participação.

Esse medinho de arriscar tem razão de ser: quem já provou do amargo gosto da decepção jamais retorna com tanta sede ao pote. Sabe como é, a unha até pode crescer de novo, mas nada garante que ela não vá quebrar. Simultaneamente, não se pode viver 365 dias por ano jogando no esquema defensivo, se isentando de sentir qualquer coisa que possa aumentar o nível de dopamina no organismo. Ser cauteloso é diferente de ser ignorante, daqueles que acreditam cegamente em generalizações e que todo relacionamento, obrigatoriamente, vai acabar mal. Só não se deve dar chance para quem não mereceu sequer a primeira; de resto, não se pode prever o final sem ter dado oportunidade para um começo.

Felizmente, nem todos estão infectados com esse vírus da indiferença, da falta de sensibilidade, da preocupação exacerbada com o desfecho de uma história que nem começou a ser escrita. Na tentativa de adivinhar o amanhã, perdemos o hoje, todos os dias. É nessas situações, em que me esquivo dos sentimentos por precaução, que penso que desperdiçamos muito por tão pouco. Se quer gostar? Goste. Quer amar? Ame. Quer sentir ciúme? Sinta. Quer odiar? Odeie. Sinta intensamente o que tiver vontade, aproveitando até o último segundo cada sensação, afinal de contas, não se sabe qual sensação vai ser a última.

Dani Freitas
Enviado por Dani Freitas em 23/03/2012
Código do texto: T3571939
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