Na Feira do Largo

Curitiba irá fazer aniversário no próximo dia 29, mas a data costuma passar batida – não é sequer feriado. E há muitas outras coisas que podem passar batidas em Curitiba. A Feira do Largo, por exemplo. Antes de morar lá, eu nunca havia ouvido falar nela. É uma feirinha de artesanato, que já foi chamada de “Feirinha Hippie”. Costumava ser ocupada especialmente por artistas, mas ultimamente apareceram pessoas vendendo produtos importados do Paraguai.

Nem por isso a visita se torna menos interessante. Vende-se produtos de madeira, cerâmica, porcelana, vime. Mas o melhor são os personagens. Há aqueles pintores que, em cinco minutos, fazem um quadro com uma paisagem qualquer. Há aquelas figuras que escrevem coisas em grãos de arroz. Mas, de tudo que vi, nada é mais interessante na Feira do Largo do que Hélio Leites.

Hélio Leites é um miniaturista. Tudo o que é pequeno e sem valor, Hélio aproveita. A sua arte é feita de botão, caixa de fósforos, palito de sorvete, casca de pinhão, rolhas de garrafa e latas de sardinha. Um doido, bem se vê. E sua imagem não ajuda muito: ele não tem exatamente cabelo, mas sim uma “crista”, como os galos. Todo esse estranhamento faz com que sua barraca seja uma das mais concorridas da feira. Hélio abusa da poesia e do bom humor na hora de contar as histórias por trás de seus estranhos produtos.

Alguns deles: uma seringa com um boneco de Santo Antônio dentro dela. “Injeção de ânimo”, explica. As pessoas começam a rir e ele emenda: “Tá vendo? A pessoa vê isso aqui, dá risada e esquece dos problemas”. Um palito de sorvete transformado numa arara. É o indicador de TPM: a mulher coloca na camisa, usa como botton, e todo mundo conhece o seu estado de espírito. Uma mola com um boneco em cima: São Longuinho, para as pessoas que não puderem dar três pulinhos – às vezes a pessoa pula, torce a perna, e o prejuízo é maior.

E assim, Hélio Leites conquista a Feira. Ninguém diz que aquele homem cursou economia e trabalhou em banco. Um belo dia, largou tudo e começou a trabalhar com coisas sem importância. Foi ser artista de rua. Criou o Museu do Botão. Fez Escola de Samba de caixinha de fósforo. Pensou em criar um assobiódromo – um lugar para as pessoas assobiarem sem perturbar ninguém. E, depois de tudo isso, brilha numa feira de artesanato em que a maioria das pessoas não está interessada em comprar os seus produtos.

Henrique Fendrich
Enviado por Henrique Fendrich em 23/03/2012
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