NÃO CHORA MANOEL
“Não chora Manoel, não chora, porque não tens o limão. Ele aqui não está, por aqui não passou, lá no meio do caminho, algum freguês o apanhou”.
Essa era a cantiga que minha mãe cantava, quando eu, ainda criança, fazia minhas malcriações ou chorava por pouca coisa. Essa canção era melodiosa e fazia parte de uma história que ela costumava contar:
“Manoel era um menino pobre, órfão de pai e vendia limões na feira para o quitandeiro, a fim de ajudar a mãe nas despesas. O homem, muito ganancioso, lhe entregava uma quantidade certa de limões para serem vendidos às dúzias e meias dúzias e o pobre Manoel, se não vendesse todos, tinha sempre que voltar com o dinheiro certo correspondente ao que vendera e os limões que sobrassem tinham que somar no mínimo sempre seis ou doze.
Perdesse ele um limão que fosse e o danado do quitandeiro descontava seis do seu parco pagamento. De modo que ele tinha que tomar muito cuidado com o tabuleiro que levava no peito pendurado no pescoço. Naquele dia, porém, alguém nele esbarrara e os limões se espalharam pelo chão. O menino, aflito, pediu a um feirante que cuidasse do tabuleiro enquanto ele tentava recuperar os limões. Saiu desesperado entre as pernas das pessoas catando os limões. Catou quase todos mas não conseguiu recuperar um, apenas um.
Ao final da feira, depois de haver vendido quase todos, triste por lhe restarem cinco limões, sentou-se na calçada a chorar.
Nunca antes isso havia ocorrido. Ele era cuidadoso e sua mãe estava doente e precisando de remédios, que ele ajudaria a comprar com o que vendesse e sendo descontado, seu ganho não seria suficiente para tanto”.
Ele tinha uma razão forte para chorar.
Minha mãe encerrava a história cantando essa canção:
“Não chora Manoel, não chora....”
Só depois de crescido é que pude entender porque minha mãe a cantava quando eu chorava a toa. No fundo ela queria me dizer que eu não era como o Manoel e que havia motivos mais fortes para que chorássemos.
E quando ela veio a falecer eu descobri que dentro de mim também existia um Manoel, que choraria sua ausência para o resto da vida.