CHIQUINHO VOOU

     Certamente se você não for um dos poucos leitores que me acompanham, não entenderá muito, ou não compreenderá o que relato a seguir.
     Em outras ocasiões escreví sobre o BAR DO POETA SEM PERNAS.
     Não era um bar qualquer. Lá eram servidos em meio aos camarões rosadinhos, sirís ao molho de coco, uma poesia da melhor cepa. Chiquinho, meu querido poeta/irmão, circulava pelas mesas a declamar seus poemas. Geralmente falavam de amor e de flores. Sua musa, de nome de flor, Margarida. O barulho de sua humilde cadeira de rodas se misturava a sua voz numa sintonia perfeita.
     O cenário, indescritível. O bar avança pelo rio/mar. Por vezes o apito de um navio rasga a noite enchendo o silêncio. O chegar e o partir já se fizeram rotina. Em frente ao braço de rio/mar, uma nesga de mangue borda a areia alva da ilha de Forte-Velho. Gaivotas dançam sobre as aguas em vôos rasantes, como a lamber a agua numa demonstração de visível superioridade. A liberdade vivida plenamente. Perto, o trapiche que serve de ancoradouro aos ônibus do mar que fazem a travessia Cabedelo/Forte-Velho, indo e vindo, engolindo agua e cuspindo gente e coisas, num resfolegar cadenceado.
       Tudo aparentemente igual, mas algo mudou. Já não se ouve o ranger da tosca cadeira, já não se ouve mais a poesia de Chiquinho. Sem avisos, sem despedidas, nem lamúrias, Chiquinho partiu. Partiu deixando um buraco descomunal no seu canto, no seu recanto e no meu coração. Deixou um poema por terminar.
        Vai em paz Chiquinho, que suas gaivotas te levem com ternura e que onde estiver possas continuar a poetar. O Bar do Poeta sem Pernas continuará aberto, mas sem alma.
       Mais um poeta vira núvem, vira poesia alada, vira bruma, flor, pedaços de amor...