ANTES DA VIAGEM, O ÓCIO DAS TEORIAS VI

Sou nordestino nascido e criado no mato, por isso eu, ao me levantar, todos os dias, pego o sol com a mão” (Raí)

Véspera de viagem, a ansiedade tomou conta de mim. Afinal de contas eu estava prestes a voltar 30 anos no tempo e ver, ao chegar do alto, a Cidade Maravilhosa...

Antes, porém, as obrigações de início de mês me levaram a uma agência bancária, para efetuar pagamentos e retirar, também, uma quantia para a viagem. Enquanto eu digitava números e recebia, em contrapartida, os recibos de comprovações dos pagamentos, alguém me cumprimentou chamando o meu nome.

Ao virar-me, vi o grande personagem do Ócio das Teorias, o emblemático Rodolfo – hoje, um bem sucedido empreendedor no ramo das comunicações. Fazia tempo que eu não o via; por isso, eu fiquei feliz em poder dialogar um pouco com uma pessoa que, apesar dos métodos, digamos, excêntricos para economizar o seu rico dinheirinho, é, sem dúvida, uma grande figura e um excelente interlocutor quando desejamos manter uma interessante conversa informal, independente da hora e do lugar em que estivermos.

Inicialmente, ele me perguntou o que eu andava fazendo, sobre as crônicas na Gazeta do Oeste, sobre a minha filha e até sobre uma proposta de trabalho, como correspondente, para ela. Confesso que não insisti, mais profundamente, sobre a proposta – deixando para ela mesma – ao comunicar-lhe sobre o oferecimento do caro teorista – a tarefa de informá-lo sobre sua decisão e, conforme a resposta, o acerto dos detalhes com ele.

Além do mais, o tempo que eu dispunha e, acredito, ele também, era curtíssimo. Assim, eu preferi abrir espaço, neste pequeno tempo, para receber as miraculosas e extravagantes (parece um paradoxo, em se tratando do teorista) – porém (para quem segue passo a passo) acertadas – dicas de como, ao “fechar a mão”, abrirem-se os caminhos para a fortuna.

Só para ver a reação do contemporâneo do Tio Patinhas, eu lhe disse que ia ao Rio de Janeiro, para o Encontro Nacional de Formação de Mediadores de Leitura, e lhe perguntei se ele conhecia algum lugar BBB (bom, bonito e barato) para eu me hospedar e, também, um restaurante na mesma linha (foi maldade da minha parte, pois, o hotel e, consequentemente, as refeições já estavam definidos pela organização do evento).

Ao perguntar-lhe isso, o ilustre teorista franziu o cenho e, ao fazê-lo, eu vi uma tristeza expressiva em seu olhar de memória. Ficou claro, mesmo antes que ele me dissesse alguma coisa, que a pergunta tinha causado uma lembrança não muito feliz para o caro conterrâneo.

- Até que tinha o melhor hotel e, também, o melhor restaurante do Rio (é claro que, fazendo uma filtragem, melhor significava, principalmente, o item “mais barato” em todos os quesitos). Porém, continuou o caro teórico, quis o destino que (ao dizer isso, eu percebi nele um ar de desânimo, puxado para o teatral – como se fosse uma peça encenada em monólogo) uma tragédia se abatesse sobre estes locais.

E continuou:

Agora, no final do ano, sem mais nem menos, uma explosão vinda do interior do restaurante acabou por reduzi-lo a pó e, com isso, o hotel – que ficava na parte de trás do restaurante – foi danificado em sua estrutura física, concluiu.

Lembrei-me do fato ocorrido. Infelizmente, vidas foram ceifadas no fato narrado pelo teorista Rodolfo.

Para desviar do assunto, que estava deixando a nossa conversa um pouco “pesada”, eu lhe disse que, para aproveitar as suas teorias, eu pretendia procurar, primeiro, um restaurante e lá eu iria propor ao gerente que, se eu conseguisse levar um grupo de professores para almoçar e jantar por lá, se eu teria, como recompensa, as minhas refeições, digamos, elevadas à categoria de “gratuitas” (Ócio das Teorias V – Viagem a Nova Iorque/EUA).

- Aprenda a economizar, professor, disse-me. Se fizer direitinho, você pode disponibilizar o dinheiro economizado em peças de teatro, exposições de arte, visita ao Cristo Redentor, Pão de Açúcar, entre outras coisas maravilhosas para se ver e assistir no Rio de Janeiro, falou efusivamente – principalmente, acredito eu, por ouvir de alguém que as suas teorias estavam sendo postas em prática.

Desta vez ele estava coberto de razão, apesar de não concordar com o método empregado, claro. Estar no Rio e poder ver ou assistir às suas pluralidades culturais, qualquer esforço valeria a pena.

Se por um lado era até excessivo o ar de satisfação do “doutor” em finanças, por outro lado, diferentemente do sorriso estampado no rosto dele, eu senti um calafrio tomar conta de mim, pois me passou pela cabeça (ora, se passou pela minha mente, imagine se não passou pela cabeça de quem vive 24 horas procurando atalhos para estar sempre levando vantagem diante de situações adversas) que o simples fato de ter levantado a hipótese de me utilizar de sua estratégia, ele me cobrasse os direitos autorais sobre isso.

Felizmente, ele não atentou para o detalhe – ou, se atentou, vai esperar, primeiro, que eu me utilize dela, para, depois, cobrar-me os devidos direitos – sei lá! – e eu despedi-me dele e saí dali convencido que o mundo pode até mudar, porém Rodolfo só mudará as estratégias – para acompanhar essas evoluções – sem, no entanto, mudar a sua base teórica de pensar.

Enquanto voltava para a minha residência, eu comecei a viver a viagem que estava para fazer...




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Raimundo Antonio de Souza Lopes
Enviado por Raimundo Antonio de Souza Lopes em 11/03/2012
Reeditado em 19/04/2019
Código do texto: T3547983
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