O Amanhã
Dia Internacional da Mulher
Cineastas, jornalistas e professores de História ou Estudos Sociais são provavelmente as pessoas com nível de politização mais alto. O que não impede que tenhamos pessoas altamente politizadas em outras atividades.
Ocorre que o cinema, meio em paralelo à dramaturgia, as formas de mídia escrita e as cadeiras de História e Estudos Sociais, aparentemente nos dão mais chance de entender as relações entre os homens, suas dificuldades e progressos no estabelecimento dos seus jogos de poder ou de domínio.
É claro que dessas três atividades emergem escritores, em decorrência da necessidade que têm de mostrar às pessoas o resultado das suas conclusões. Tudo isso redundando na importância da leitura, que tem no livro o seu ponto de culminância.
Decorre daí a necessidade capital da alfabetização, da educação e, porque não dizer, da cultura. Só que não basta aprender a ler, ou escrever. Assim como também não basta que tenhamos devorado uma infinidade de livros ao longo da nossa existência. Seria preciso que desde cedo aprendêssemos a exercitar o importante potencial de raciocínio de que todos somos dotados. Todos necessitaríamos de aprender a pensar. Como entender uma produção do grande Glauber Rocha sem reunirmos condições para descobrir o que é aparentemente difícil de apreender em suas obras?
Quando nascemos depositam-nos um monte de clichês que só mais tarde teremos condições de aceitá-los como verdadeiros. A reposta à pergunta “Quem descobriu o Brasil” não sei se é ainda automática nas séries iniciais dos bancos escolares. No entanto, ao crescermos mais um pouco, poderemos aceitar (e até nos surpreendermos) com entendimento mais profundo a idéia de que o Brasil não foi descoberto, mas, sim, invadido. De fato, já havia aqui comunidades indígenas com as suas línguas, suas formas de vida, sua religiosidade e sua organização e costumes. Em muitos aspectos superiores aos do invasor “branco”, poluidor dos rios e introdutor da mentira e da cobiça, entre outras coisas, pelos metais por ele considerados preciosos. E também introdutor de práticas que acabam por torná-lo infeliz, como a competição, a corrupção e a acumulação de propriedades e riquezas.
Qual será a verdadeira razão para a irracionalidade entre os humanos? Para os massacres realizados pelos japoneses contra os chineses, para os massacres contra os armênios, para a discriminação que ainda existe contra os negros, para a eterna perda de vidas no Oriente Médio?
Cedo aprendemos que o homem briga sempre por duas coisas: mulher e... dinheiro. Só que não evoluímos a partir daí. Não conseguimos propor uma modificação para esse conceito, impregnado de uma conotação que penso ser machista. Quando sabemos que o machismo finalmente começa a ser criticado. Mas ainda está muito longe de ser erradicado.
A propósito, o que deu origem ao dia de amanhã – Dia Internacional da Mulher? Nesse dia, em 1857, em decorrência de protestos gerados por péssimas condições de trabalho e baixos salários, operárias de uma fábrica têxtil em Nova York foram trancadas no estabelecimento que depois foi incendiado. Cerca de 130 tecelãs foram carbonizadas, tendo sido instituído em sua homenagem, na Dinamarca, a partir de 1910, o Dia Internacional da Mulher.
Apesar de termos hoje presidentas, de mulheres votarem, dirigirem caminhões e integrarem as forças armadas, ainda precisamos ter um dia internacionalmente a elas dedicado. Não pela magia dos seus sorrisos, pela docilidade que nos remete à flor, pelos encantos que se escondem pelos cantos e beiradas do que elas têm entre as pernas ou pela eternidade de serem a matriz da raça humana. A elas dedicamos esse dia pela dor que desde cedo aprendem a suportar, a pior delas talvez a que ainda se trava contra a outra espécie. Evidenciando-se ainda em nossos dias uma forma desumana de distinção de gêneros.
De qualquer forma a racionalidade dos homens, no campo das suas necessidades espirituais, não caminha com a mesma velocidade que ela se verifica quando as suas necessidades são de ordem eletro-eletrônica. O amanhã não chega rápido porque a gente quer. Ainda que decidamos que tenha que ser o dia seguinte.
Depois do triste episódio da fábrica têxtil em Nova York, muitas outras atrocidades têm sido cometidas entre os humanos. Contra homens e mulheres. Vale citar como exemplo, muito perto de nós, o que realizaram as ditaduras no chamado Cone Sul, de que não se exclui o Brasil, com as perseguições, torturas e assassinatos cometidos durante a vigência do regime militar. Como também o terror instaurado pela Santa Inquisição, sob o acobertamento da Igreja Católica. E, por fim, com tudo o que acontece todos os dias pelo mundo, destacando-se a admissão da tortura pela grande nação americana, que se apresenta diante do planeta como a maior defensora da democracia.
Tudo isso justificando a irracionalidade como uma de nossas principais características. Exatamente os humanos, considerados racionais pela sua capacidade superior de entendimento em relação aos outros animais. Particularmente dando-me a impressão de que tudo é realmente o contrário.
Rio, 07/03/2012