RINDO DO PASSADO E DO PRESENTE

O tempo é o implacável inimigo da beleza exterior, todos somos derrotados por ele, mormente as mulheres que se deixam vencer sem lutar, sem buscar alternativas para sobreviver a ele. Por outro lado, contudo, esse vilão inexorável é o grande aliado da experiência, pois é através dele que a maturidade nos vem preparar para os dias que vão passando paulatinamente. Vão-se a beleza e o glamour do passado e permanecem as lembranças, as reflexões sobre o que fizemos ou deixamos de realizar.

Naquele dia ensolarado, lembra?, muitos anos atrás, nos encontrávamos reunidos nos alhures de outrora, uma turma de jovens sonhadores, eu, na ingenuidade de minha adolescência, me acabando de amores por você, ansioso apenas por um só de seus olhares de ternura distribuídos a tantos. Que, infelizmente naquele instante, não veio. Houve um momento em que todos riam por algo sem qualquer graça dito por alguém, ou talvez porque fazíamos pose para fotografia, decerto foi por essa razão, e eu, sensível, louco por você, segurava as lágrimas num rosto sisudo para não demonstrar a tristeza de minha paixão desprezada por sua insensibilidade. Quanto expressão de indiferença eu parecia sentir, ou até mesmo sentia no pulsar de minha dor solitária. Você ria abertamente feliz, eu chorava por dentro, pois incapaz de mostrar minha dor por causa da vergonha que sentiria diante dos demais ali conosco. Por dentro eu morria, por fora eu represava a mágoa e a melancolia nas faces e nuns olhos fechados ao ar de soberba felicidade estampado nos outros.

Tenho comigo uma cópia daquela foto. Sabia que de todos os presentes nessa imagem, cerca de vinte pessoas, somente eu estava circunspecto, implodindo destruidora tristeza? Só não pude deixar de fechar-me sombrio enquanto a correnteza de angústia corria enlouquecida para algum lugar escondido do meu coração, àquela altura certamente já transbordando. Todos riam alegres, todos mesmo, e no entanto lá estava eu destoando do grupo com meu olhar distante. Entre esses sorrisos coletivos, o seu se mostrava o mais esfuziante, o mais indecentemente aberto, o mais abertamente franco, o mais desbragado...no entender de minhas amargas emoções.

Outro dia, por um desses acasos do destino, entrei numa rede social e revi você numa foto atual, e comecei a rir sem parar, quase descontrolado, zombando dessa brincadeira aprontada pelo destino. Olhei gargalhando e tornei a olhar várias vezes seu presente estado, sem acreditar. Que mudança radical, extraordinária, assombrosa! Sim, hoje, tanto tempo passado depois daquela ensolarada manhã, olho para você e não compreendo por que sofri tanto por alguém que se tornou um bagulho obesa, horrorosa, que não se cuida por ter perdido a vaidade, e se revela, na foto, rabugenta, tosca e acabada.

Gilbamar de Oliveira Bezerra
Enviado por Gilbamar de Oliveira Bezerra em 07/03/2012
Reeditado em 08/03/2012
Código do texto: T3541283
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