PREDADORES I

Suave como sombra, a gata (Felis catus) se esgueirava pelo espaço entre a parede e o telhado onde pousavam os pombos (Columba livia) antes de descerem para o chão do terreno onde há sempre o que comer, sob a frondosa mangueira (Mangifera indica) ou junto ao tronco mirrado da acerola (Malpighia glabra), porque o galo e as galinhas (Gallus gallus domesticus) que são criados ali estão o tempo todo revolvendo a terra e sempre sobra um pouco de pão velho umedecido ou de ração industrializada e, em caso de muita sorte, um ou outro grão de milho (Zea mayz).

Num movimento repentino, um pedaço de telha se desloca e cai.

O estilhaçar ruidoso no contato com o chão cimentado da garagem provoca a revoada dos pombos e a gatinha, desiludida, passa por cima do muro e desce para o terreno.

Afinal, se não foi dessa vez, pelo menos lá em baixo há água fresca para aliviar a sede provocada pela tensão da caçada frustrada.

Sob a moita de capim limão (Cymbopogon citratus), a sombra convidativa para uma soneca não deve ser desprezada e a gata negra como as noites sem luar, deita-se e fecha os seus olhos de esmeralda, antegozando o merecido repouso.

Desavisadamente o casal de pombos desce para forragear.

Enquanto a fêmea procura com que encher o papo, o macho atendendo ao comando natural para reprodução ensaia os movimentos da exibição de sua bela plumagem que é convite irresistível para o acasalamento.

O bater das asas, o arrastar das penas no chão e os arrulhos são sons muito além dos necessários para deixar a predadora alerta que, em posição de ataque, observa a corte das aves protegida pela folhagem densa do capim.

O ataque certeiro não demorou.

Rápida como raio, numa fração de segundo, o pombo agonizava com o pescoço partido entre os dentes fortes da gata que, satisfeita com o resultado da caçada, levou o produto para sua loca, onde provavelmente a ninhada de gatinhos esperava pelo almoço.