Direto do Leblon

            Tudo é graça o que dela se pode dizer.
                                             Tomé de Souza

      Era como se a cerveja evitasse a queda do meu avião. Assim eu imaginava - tomando todas -, enquanto voava de Salvador para o Rio de Janeiro. Só tomando umas e outras perco o medo de voar. Condenável, mas, fazer o quê? Me digam.
     Salvo passageiras e leves turbulências, o voo foi maravilhoso, apesar do sumário lanche servido a bordo pela TAM, longe de parecer com aquela empresa do saudoso comandante Rolim Amaro, seu fundador.
     No seu tempo, os passageiros subiam e desciam as escadas do avião pisando num tapete vermelho, uma cortesia que cativava o cliente. Acho que alguém ainda se lembra disso.
     Pousei no Galeão recitando a Oração para aviadores, poema do querido Manuel Bandeira.  Nele o poeta pernambucano pede a Santa Clara de Assis que proteja o piloto e as asas do avião: "Santa Clara, clareai."

     Neste momento, encontro-me diante do mar do Leblon; bem diferente do mar da Bahia; bem diferente do mar do Ceará, mares que conheço na intimidade. 
     A tarde carioca é de um esplendoroso sol e de lindas mulheres... "a caminho do mar". Garotas do Leblon tão faceiras quanto as garotas de Ipanema. 
     Nesse pra-lá-e-pra-cá, elas divertem os olhos do cronista, que as observa nos seus mínimos detalhes. Desde seus instigantes requebros aos seus impecáveis contornos. 
     Estou na Delfim Moreira. Escrevo esta crônica num guardanapo de papel, coisa que costumo fazer.
      Avisto a favela do Vidigal que se esparrama por sobre o dorso do morro Dois irmãos, outro cartão-postal da cidade de Tom Jobim. 
     Mais além, as ilhas Cagárras onde ainda ressoam os gemidos dos presos políticos, vítimas da ditadura militar, nos idos de 1964-70 e mais um pouco. 
     Mas um barquinho a vela que desponta no horizonte circundando as ilhas, ajuda a apagar as infames lembranças dos anos de chumbo.
     O sol se esconde, lentamente, por detrás do morro Dois Irmãos. No calçadão, o espetáculo do por do sol é aplaudido por centenas de pessoas, entre elas, eu. Que felicidade!
     A favela do Vidigal e de João Paulo II ascende suas primeiras luzes, enfeitando o Dois Irmãos já quase escondido na escuridão da noite que se aproxima.
     Tomo minha última cervejinha num quiosque à beira-mar, certo de que, amanhã, o espetáculo continua. 
     O Rio de Janeiro continua, não, é sempre lindo!

     

 

Felipe Jucá
Enviado por Felipe Jucá em 03/03/2012
Reeditado em 23/03/2012
Código do texto: T3532184