SOBRE A MORTE
Enquanto estava na faculdade precisei aprender a lidar com a morte pois precisaria passar por esse enfrentamento na profissão que escolhi. No momento que essa matéria foi se descortinando pra mim entendi sua importância. Até então achava impossível ensinar teoricamente o que fazer com a dor da perda, mas depois pude entender a relevância de se estudar a respeito. E exatamente hoje vivencio dois tipos de perda em mim: a morte física, pois acabo de perder um amigo, e a morte em vida, pois também acabo de perder mais pessoas e preciso lidar com isso.
E é exatamente agora que tento relembrar minha teoria da graduação e acabo recordando da piquiatra Elisabeth Kubler-Ross que classificou a experiência com a morte em cinco estágios e creio que sejam válidos quando sabemos da nossa morte em breve, quando é morte física de um ente querido e por que não quando acontece a morte de uma relação em vida, analisem comigo se não há um perfeito encaixe.
O primeiro estágio é chamado de negação e isolamento e são mecanismos de defesa do nosso consciente diante da dor. A duração e intensidade são variáveis mas não costumam durar muito tempo. (Ao perder um amigo/amor nossa primeira reação não é essa de imediato?)
Mais rápido do que imaginamos, entramos no segundo. É o estágio da raiva. O consciente não consegue manter a negação e o isolamento e então brigamos com todos e tudo, hostilizamos, somos agressivos, nos revoltamos. "Por que eu/ele?". Momento em que a angústia vira raiva pela interrupção da vida. (Num rompimento de relação também sentimos essa raiva por dentro. Ou ela existe pelo outro, por ter gerado sofrimento em nós ou existe por nós mesmos. Sentimos raiva por termos permitido a entrega, incondicional.)
E chegamos no terceiro momento: a Barganha. Essa fase acontece quando entendemos que, mesmo deixando de lado a negação e o isolamento, mesmo a raiva não ter sido solução, precisamos fazer algo. E começamos a barganhar com Deus. Mas fazemos isso em segredo. Mas vejam, o que temos de valioso a oferecer a Deus, para o "sacrifício", já que não temos mais a vida para ser negociada? E essa barganha vira súplica e promessa. Uma tentativa de adiamento. E para barganhar com Deus é necessário estar sereno e dócil, sem hostilizar ninguém. (Na prática é quando pedimos ajuda a Deus ou a algo que acreditamos como Superior a nós. Queremos sair do processo, deixar a dor, respirar. E aqui, bem no meio dos estágios, muita gente pára. As pessoas gostam desse tipo de dor e não percebem que se adiantam rumo ao precipício do sofrimento. Descobrem que não adianta negociar e entram no próximo nível).
Após descobrir que nada funcionou, nem mesmo a barganha, nos encontramos no penúltimo estágio, que é o da Depressão. Não há como negar a perspectiva de morte nem mesmo a morte em si. A debilidade toma conta, a falta de perspectiva é dolorosamente sentida. Negar não adiantou, agredir e se revoltar também não, fazer barganhas não resolveu. E então chega o sentimento da perda trazendo em si a dor psíquica da realidade dura, a consciência de que nascemos e morremos sozinhos. Somos puro desânimo, desinteresse, apatia, tristeza, choro. (E aqui faço um adendo. O ser humano parece gostar de sofrer. A maioria entra na fase depressiva e não sai dela. Não porque não consiga, mas por achar que assim conseguirá atenção e carinho. Esquecem que carência é algo mais sério e transformam um processo em vitrine de sentimentos. Essa exposição torna-se caótica e a falta de respeikto e amor-próprio domina. Sim, algumas pessoas não saem dessa fase porque não querem).
Chegamos ao último estágio: Aceitação. Não existe mais o desespero, nem fuga da realidade. Chegou a hora de repousar, descansar. Sentimos conforto por quem vai/foi. (Entendemos, nesse ponto, que uma relação se finda independente do que sentimos. Se uma pessoa se vai não tem como continuar convivendo. Deixe-a ir. Apenas envie pensamentos e sentimentos de amor, carinho, compreensão.)
E foi muito bom escrever sobre isso e relembrar cada passo. Foi a forma que consegui para passar correndo pela depressão e chegar no nível de aceitação. Eu aceito a morte do meu amigo e agora, aceito também as mortes que vão acontecendo em mim. Meu achismo não trará ninguém de volta por mais que eu não consiga ver a culpa em mim. Isso também não importa mais. Quem eu amo se foi de mim. Ponto.
Crônica escrita em 14/12/11, após a morte de um amigo querido.