PEDRA
Eu não queria pensar em nada. Só queria fugir. Fugir de mim. Me esconder da vida. Me sentia sujo. Desprezível. Fraco. Falso. Mas, lembranças me levavam de volta até o mar, naquele dia em que O vi pela primeira vez. Tinha um rosto familiar, comum, mas no seu olhar havia uma mensagem que, mesmo sem palavras, falou ao meu coração. Dos Seus Lábios ouvi uma frase que mudou minha vida: "Segue-me". Sem garantias de nada, sem mesmo saber o que significava o convite, larguei tudo e fui com Ele. Fui e vi, e o que vi mudou a minha existência. Vi marginais se reconciliando; Esperança no caos; Luz na escuridão; Fé sem religiões; Eu Vi. Eu testemunhei tamanha Autoridade que até o vento e o mar obedeciam ao Seu Comando; Vi, Suas mãos estendidas à todos, independente de classe social, nacionalidade, castas, idade e cor. Vi que diante Dele o mal se dissipava.
Até que um dia, ou melhor, uma noite, Ele nos reuniu e fez um discurso simples, alertou para alguns acontecimentos futuros. Disse que seria entregue nas mãos dos homens. Confesso que estava confuso com tudo aquilo, ansioso por alguma coisa que não sabia bem o que era. Até que ele falou abertamente que entre nós, havia um traidor. Houve um silencio. Fiz um sinal para um dos companheiros, mas não obtive resposta. Não me contive mais e falei em plenos pulmões que iria com Ele até a morte! Foi quando encontrei Seu Olhar, Aquele olhar, acompanhado de uma frase "Tu me negarás três vezes". Não! Impossível! Não sou assim! Fiquei indignado! Vi que um se levantou e saiu da sala. Logo depois fomos para um jardim onde Ele costumava nos levar. Falou algo que não entendi bem, e se afastou. Meus olhos pesavam de sono. Me recostei numa arvore só acordei com a Sua Voz, desta vez nervosa: "Não poder ficar comigo só um pouco?". Não respondi. Neste momento, ouvimos vozes e avistamos um de nós a frente de uma multidão. Judas, era o seu nome, ele se aproximou e O beijou. Foi quando um dos guardas fez menção de prende-lo; eu, rapidamente saquei uma espada e cortei a orelha do tal! Foi quando ouvi a Voz e mais uma vez o nome que ele me chamava: "Pedro, guarda tua espada". Cai ao chão e vi quando o levaram. Surpreendentemente, a Voz que acalmava a fúria da natureza, permaneceu calada diante das acusações e dos xingamentos; as mãos que ressuscitaram mortos e curaram várias moléstias, não reagiam as bofetadas. Um misto de raiva e desapontamento foram tomando conta do meu coração. Porém ainda que a distancia, acompanhei seus passos.
Chegando na cidade, vi quando o levaram para a casa do Sumo Sacerdote. Decidi continuar a distancia. Foi quando alguém me perguntou em tom de acusação: "Você também andava com Ele"... "Não", respondi. Depois... "Não o conheço" e finalmente "Não".
Três vezes O neguei. Fiquei alí. Parado. Até que ouvi o cantar de um galo. Lembrei-me das Suas Palavras. Senti o amargo da minha natureza caída e chorei um choro da alma. Morri por dentro.
Não sabia o que fazer. Corri, corri para o mais longe possível. Vivi a noite mais longa da minha vida. Pela manhã soube de sua condenação e logo depois da sua morte.
Me tranquei. Não queria mais ver ninguém. Só queria morrer, mas até para morrer me faltou coragem.
Três dias depois, na manhã de Páscoa, ouvi alguém bater na porta..... Era Maria, que chamamos de Madalena:
- Pedro!
- Sim...
- Estou vindo do túmulo do Mestre....
- Sim fale!!!!
- Pedro....
- Sim.....
- Ele não está lá...
- Como assim?
- Eu... Eu... O vi, Pedro...
- Como assim?
- Ele ressuscitou!!!!! .
- O quê?
- Sim Pedro, o Mestre venceu a morte e disse que vem até nós...
- Não Maria, não sou digno...
- Pedro, ele te convidou pelo nome "Diga à meus discípulos e a Pedro, que terei com eles..."
- Ele tocou no meu nome?
- Sim Pedro...
Senti algo brotar como vida no caos.
Não me contive, corri até o tumulo e vi que a pedra tinha sido arrastada.
Ele voltou... Ele voltou...
E assim como aquela pedra do sepulcro não impedira a Vida triunfar sobre a morte, eu, Pedro, vou viver a fé do Perdão e de uma nova chance....