COXA, EU TE AMO

Em tudo eu poderia acreditar em minha vida. Em assombração, boi tatá, lobisomem e estas coisas do sobrenatural. Em tudo, menos em que um dia iria torcer pelo Clube Atlético Paranaense, o odiado rival do meu time do coração, o Glorioso (assim mesmo, em letras maiúsculas) Coritiba Foot Ball Clube e, em pleno Alto de Tantas Glórias.

Era primeiro de maio, o ano eu não sei, mas deve ter sido lá pelos idos de 1969, 1970.

O Esquadrão Coritibano desfilava um verdadeiro ofidário nos gramados: Célio, Oberdã, Roderlei, Krugger, Nilo, Hidalgo, Cláudio Marques, Zé Roberto e outros tantos, encantando a todos com um futebol vistoso e vencedor.

Naquela tarde ensolarada fui assistir a um Atletiba, junto com um amigo que, por puro mau gosto, era torcedor atleticano. Eu sei, eu sei, não deveria andar em más companhias, mas acontece. Acreditem, tem vezes que escuto os comentários do Fernando Gomes, aquele comentarista da Rádio Transamérica que só fala bobagens. São coisas que nem o ET sabe explicar. ET é outro personagem da Transamérica pouco inteligente mas com QI superior ao FG. São momentos de fraqueza que todos nós estamos sujeitos nesta trajetória mundana.

Obviamente, eu queria sentar ao lado da torcida coxa, mas meu amigo, tinhoso que era, teimou em se dirigir para o lado atleticano. – Vamos jogar no palito, propus. Quem perder vai ver o jogo junto com o inimigo.

Não era meu dia de sorte, com certeza. Perdi no jogo e dívida de jogo a gente paga para não dar azar.

Com o coração partido lá fui eu rumo ao matadouro. Desolado, cabeça baixa, triste e envergonhado. Já pensou se alguém me visse em lugar tão comprometedor? O que iriam pensar de mim? Até hoje minha mãe não sabe deste meu deslize.

O jogo já se encaminhava para o seu final; segundo tempo, placar igual, um gol para cada lado. Os rubro-negros vibravam. Afinal, estavam conseguindo empatar com o time mais querido do Estado, talvez do Brasil, quiçá do mundo e futuramente da Via Látea.

A turba guinchava “Geladeira... geladeira...” para a torcida mais bonita da Via Látea, futuramente do Universo, quando outros mundos habitados forem descobertos.

Remoendo a raiva, eu tinha vontade de me transformar no Rambo e espalhar a poeira naquela arquibancada. Mas sou educado, sou Coxa e assim me mantive firme e fleumático.

Foi então que um chute de longa distância, forte, bem direcionado, guiado pelas forças divinas, tomou o rumo do gol atleticano. O goleiro se esparramou todo pelo gramado, mas não conseguiu deter a pelota. Pulei no ar e com o braço erguido socando o ar larguei aquele grito de GOOOOOL que estava entalado na minha garganta. Ainda no ar, em uma fração de milésimos de segundo me dei conta que a torcida inteira do Atrético (assim, com “r”) estava olhando em minha direção.

Sou coxa-branca, mas não sou burro; subi gritando gol e desci xingando a hipotética progenitora do meu querido Coritiba. “Time largo, Fedapê, PQP, #*&(?, etc.

Faltava um minuto para o jogo terminar. Larguei meu amigo e desci as escadarias. Olhei para trás e vi o rosto triste e acabrunhado dos treticanos. Ergui o braço e gritei bem alto: COXA, EU TE AMO!!!

Deu para ouvir o tropel de uns trinta correndo atrás de mim. Rapidamente corri para o lado da torcida coxa. Fui recebido com vivas e hurras. Erguido nos braços do meu povão gritei novamente: - COXA, EU TE AMO! O Estádio estremeceu aos gritos do resto da torcida: COXA... COXA...COXA...

PS: Já confessei ao Padre por ter falado mal da progenitora do Coritiba. O Vigário disse que eu estava perdoado, mas que se caísse de novo em pecado teria que assistir mais dez Atletibas junto com o os poodles, sendo um deles na Arena. Benza Deus!