LIÇÃO DE TEOLOGIA
O texto a seguir foi extraído de “Crônicas da Vida Inteira", livro inédito sobre fatos da minha vida, adaptado para o Recanto das Letras.
LIÇÃO DE TEOLOGIA
Na minha infância ninguém conhecia esse velho enxerido, chamado Papai Noel, que vem cada vez mais se intrometendo nos festejos natalinos, desvirtuando o caráter cristão e a beleza dessa festa antigamente tão esperada pela garotada. Lá no meu saudoso sertão era o Menino Jesus quem vinha trazer os presentes pra criançada, e não esse velho barbudo e feio que mais deveria assustar do que receber os carinhos da petizada.
Faltavam poucos dias pro Natal, e a minha ansiedade pela chegada do grande dia era grande também. Não via a hora de acordar e sair de ponta-cabeça à procura do prato de presentes do Menino Jesus, como fazíamos todos os anos. Com tal ansiedade, certo dia, estando com ela na roça, eu abordei mamãe:
— Ô mãe, o Natal é o dia mais importante, não é? — perguntei na certeza de receber uma resposta positiva.
Mamãe, que Deus a tenha, pois aquele momento já a fez merecedora do céu, parou de capinar, apoiou as mãos no cabo da enxada e olhou-me com aquele olhar que só as mães sabem ter e sorriu levemente, como que recebendo a inspiração necessária para a resposta acertada.
— Não, meu filho, não é o Natal não.
— Ué não é! — reagi imediatamente e decepcionado. — Qual é então?
— É a Páscoa — respondeu-me ela calmamente.
— A Páscoa? Por quê? — perguntei duvidoso ainda.
— Por quê? É porque no Natal se comemora o nascimento de Jesus Cristo. Mas na Páscoa, se festeja a ressurreição de Cristo.
— E daí? — insisti.
— Daí... Acontece que nascer sem Cristo, todos nós nascemos, meu filho, até os animais. Mas ninguém pode ressuscitar sem Ele.
Bem se diz que os conhecimentos vêm dos homens, mas a Sabedoria vem de Deus. Ainda hoje, sob o peso dos meus setenta e três anos, às vezes me ponho a pensar naquele momento e bendigo a Deus pela mãe que tive. Analfabeta, é verdade, mas de uma sabedoria extraordinária.